Artigo: Não priemos cânico

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Por: Rodrigo Segantini*

Uma das coisas boas em se morar em uma cidade de médio porte no interior de São Paulo, como é Taquaritinga, é o sossego e a tranquilidade que há por aqui – alguns dirão que é tranquilo e sossegado até demais. Porém, convenhamos, isso realmente é algo muito importante, pois nos traz conforto e uma sensação preciosa de segurança, a qual já não existe em alguns lugares por aí.

Porém, notícias que chegam de outra parte do país reportando algo assombroso causam medo em nossos corações quando sugerem que essa paz que temos por aqui pode ser ameaçada. Os relatos acerca de atentados a alunos e professores dentro de escolas pelo Brasil afora tem trazido enorme intranquilidade à população do país inteiro. Em Taquaritinga, não está sendo diferente, mesmo não havendo sequer indícios de algo neste sentido possa acontecer por aqui.

Gente desequilibrada que promove esse tipo de massacre sempre existiu. Sempre houve loucos que, por algum motivo idiota ou ensandecido, saíram por aí matando pessoas a esmo, usando desculpas que vão desde um chamado religioso para alguma missão de fé até sua pura satisfação narcisista de ter o controle da vida e da morte em suas mãos, passando por aqueles que meramente executam um plano macabro de vingança. Isso sempre existiu, não é de hoje e não acabará amanhã. Porém, o que preocupa é que, quando acontece um, parece que desencadeia uma sanha de propósitos e outros doidos se sentem inspirados a seguirem tal modelo. Por isso, realmente é preciso estarmos vigilantes para estarmos preparados para conter situações assim.

Mas isso nem é o pior. O pior é que há pessoas de caráter tão malévolo que se aproveitam de tempos difíceis como esse para se divertirem e tocarem o terror apenas por prazer, fazendo trotes e falsas ameaças ou difundindo fake news. As pessoas todas com os nervos à flor da pele e, do nada, alguém acha que pode ser interessante dizer que soube que haverá um atentado a uma escola da cidade ou que conhece alguém que disse que ouviu alguém comentando que está pensando em promover um massacre em uma escola da cidade. E assim, sem que nada disso seja verdade, há toda uma mobilização para conter e evitar que algo que nunca iria acontecer de fato realmente nunca aconteça.

Como distinguir o que é verdade do que é mentira em uma situação destas? Infelizmente, não tem como. Quando os órgãos de inteligência de segurança pública ou os administradores públicos em geral recebem um informe a respeito da possibilidade de uma ocorrência de perigo, é seu dever estarem preparados para evitá-la ou contê-la e, eventualmente, acudirem suas vítimas. Como na fábula de Pedro e o Lobo, quando o menino avisa que um lobo se aproxima mesmo não sendo verdade, a cidade inteira se prepara para se defender de seu ataque. Mas esse tipo de comportamento desviado de uns marginais faz com que o pânico seja muito maior do que o risco efetivo de um atentado de verdade.

Se eu ficasse sabendo que na escola do Arthur poderia haver um ataque, sinceramente teria medo e talvez não o mandaria para a aula naquele dia. Claro, pois cautela e canja de galinha nunca fizeram mal a ninguém. Porém, é óbvio que se todos os pais pensarem assim em face de cada notícia falsa, a tensão será espalhada na comunidade até que a convivência social fique em risco. Não há uma resposta certa, portanto, do que fazer quando ficamos sabendo sobre uma possível ameaça à segurança de nossos alunos e professores, principalmente quando nós ou nossos filhos estão diretamente envolvidos.

No entanto, é preciso levarmos em conta que a vida é feita de riscos e perigos. É bem menos provável que um louco entre com um machado ou um facão na escola onde nossos filhos estudam para atentar contra suas vidas do que a possibilidade de eles sofrerem um acidente fatal ao baterem a cabeça no chão ao caírem de mal jeito durante jogando bola na quadra durante a educação física ou do que de serem atropelados enquanto atravessavam a rua na faixa de pedestre na saída depois da aula. Ainda assim, ninguém pensa em impedir os filhos de jogarem bola ou participarem da educação física e nem pensa em fazer com que evitem sair da escola ao final das aulas. É evidente que não pretendo comparar um acidente ou causalidade com um crime, mas, bem pesado e bem medido, o medo que sentimos face a uma ameaça não se justifica face às ameaças que rotineiramente já vivenciamos sem nos darmos conta.

O que quero dizer é que não devemos neste momento nos encantarmos com os oportunistas de plantão. Neste momento, os que se apresentam como baluartes da moral e dos bons costumes defenderão medidas que não tem o menor cabimento, como a presença de seguranças armados e detectores de metais dentro das escolas, como se fossem prisões. Levando ao extremo do ridículo, vamos proibir as crianças de praticarem esportes e também impedir o trânsito de carros no entorno dos prédios escolares. Devemos sim ter uma discussão séria sobre o tema para tentar solucioná-lo ou dirimi-lo, não ganhar votos e nem espalhar pânico na população.

*Rodrigo Segantini é advogado, professor universitário, mestre em psicologia pela Famerp.

**Os artigos publicados com assinatura não manifestam a opinião de O Defensor. A publicação corresponde ao propósito de estimular o debate dos problemas municipais, estaduais, nacionais e mundiais e de refletir as distintas tendências do pensamento contemporâneo.

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