Artigo: Os likes de Felipe Neto são inferiores ao esplendor machadiano

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Por: Prof. Sergio A. Sant’Anna

Na semana passada, exatamente no dia 23-01-2021, Felipe Neto, jovem youtuber, mobilizou as redes sociais quando expressou o seu posicionamento sobre Literatura: “Forçar os adolescentes a lerem Romantismo e Realismo brasileiro é um desserviço das escolas para literatura. Álvares de Azevedo e Machado de Assis não são para adolescentes! E forçar isso gera jovens que acham literatura um saco”. Num primeiro momento a hecatombe. Depois, analisando com mais calma presencia-se que o multicomentarista cometeu um desserviço aos seus seguidores, pois execrou à Machado de Assis e seu antecessor Álvares de Azevedo – autor de “Noite na taverna” e “Lira dos vinte anos”, queimando literalmente às obras dos geniais escritores. Nota-se que o jovem mancebo, que ganha o seu pão através das redes sociais e estimula milhões de jovens a segui-lo profissionalmente, conhece de Escola Literária, pois trouxe à tona duas grandes e decisivas épocas de nossa Literatura: o Romantismo ao externar a sua insatisfação com Álvares de Azevedo; e depois expurgou o seu ácido veneno contra o “Bruxo do Cosme Velho” e sua realista trajetória.

Há alguns anos este rapazote vem alternando o seu público e caçando uma área a se estabilizar como comentarista. De analista político a crítico literário, Felipe Neto parece ainda balançar diante de sua argumentação insólita e publicitária. O que ele realmente deseja são seguidores, desses que curtem seus comentários sem exercitar a racionalidade. Vale salientar, que o poeta romântico citado morreu aos 20 anos, ou seja, de acordo com a legislação vigente saíra da juventude pouco antes de falecer. Era um adolescente escrevendo para adolescentes. Talvez o jovem youtuber não conheça a obra do autor do “Macário” daí o seu desinteresse e abominação diante deste citado. Álvares de Azevedo pertenceu à Segunda Geração Romântica, Ultrarromântica, ligada ao gótico e inspirada na literatura gerada por Lord Byron. Mergulhado no mundo interior, o poeta gótico brasileiro, foi aluno do Colégio Pedro II no Rio de Janeiro, e acadêmico da Faculdade de Direito do Largo São Francisco, buscando nas leituras de Otelo e tradução dos escritos potentes do byronismo acrescer aos seus escritos a tristeza e melancolia contida nesta geração, além da boemia exposta nos traços joviais daquela geração, marcada pelo mal-do-século. Talvez a atitude do youtuber, quando decidiu realizar uma partida de futebol durante a pandemia, após execrar outro “influencer” que realizara uma festa com centenas de pessoas, foste mais inconsequente que as festas organizadas por Byron ou as noites nas tavernas externadas por Alvares de Azevedo em meio à tuberculose. Adolescentes apreciam Álvares, basta saber apresentar-lhes. Felipe Neto como muitos, teve professores de Literatura que não souberam mostrar-lhe o quão prazeroso é viajar com Rita Lee, Raul Seixas, Bryan Stocker, Mary Shelley que muito intertextualizam com o jovem ultrarromântico. Será que ele já ouviu falar daqueles que não chegavam aos 27?

A inconsequência do aspirante a cronista, que domina às redes sociais, não cessou por aí, avançou mais uma Escola Literária. Ao Realismo coube acusações a Machado de Assis e a ausência de uma linguagem acessível aos jovens. De fato, concordo que um certo arcaísmo faz parte da linguagem machadiana, pudera; Machado de Assis viveu até o início do século XX, porém sua vasta obra alcança ao público universal de 1860 a 1908 (ano do seu falecimento), cujos temas são muito mais importantes do que as palavras ali empregadas. Felipe Neto não conhece como as palavras devem ser empregadas ao levar para o público o vocábulo “desserviço”, este carregado do mais pejorativo dos termos para aquele tipo de publicação – algo típico daquele que se encontra com raiva ao se expressar. A variação linguística, não estudada pelo youtuber, demonstra que o arcaísmo é uma das variantes de nossa linguagem, e necessita de adaptações como inúmeras coleções fizeram com o acervo machadiano. Obras como “Dom Casmurro”, tornou-se “Ciumento de carteirinha”, adaptado por Moacyr Scliar; assim, também, fez-se com “O alienista”, que através dos escritos do acadêmico gaúcho ganhou o nome de “O mistério da casa verde”. Lembrando que estes são clássicos pelo fato de serem atemporais, ou seja, tratam de temas peculiares ao nosso cotidiano, além de toda beleza que carregam ao nos presentear com imensa cultura ao tratar de arquitetura, artes plásticas, música, psicologia, sociologia, filosofia, medicina e da própria importância do ato de ler. Machado de Assis talvez não tenha importância para Felipe Neto pelo fato do “crítico literário” pouco conhecer da história machadiana que se mistura com a história do Brasil, e, também, por não ter conseguido ir além das meras palavras ali destinadas. Não soube buscar soluções como muitos de nós fazemos, lendo outros que nos apresentam autores e suas obras de uma maneira suave como exemplificara neste parágrafo.

Não condeno o jovem youtuber por suas palavras, emito minha posição baseando-me no emprego incorreto de algumas palavras ao expressar sua posição, além da ausência de pesquisas diante da emissão de posição para dois monstros sagrados da nossa Literatura. Quem não conhece procura vociferar, usando incorretamente determinados vocábulos ao emitir sua posição. Machado de Assis e Álvares de Azevedo são muito melhores que Felipe Neto.

*Prof. Sergio A. Sant’Anna – Professor de Redação nas Redes Adventista e COC em SC e jornalista

**Os artigos assinados não representam a opinião de O Defensor!

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