Artigo: O racismo propaga-se pelas redes sociais: “Pai contra mãe”, de Machado de Assis e “A carne”, de Elza Soares

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Por: Sérgio Sant’Anna*

Na semana passada acabei publicando uma crônica, aqui neste periódico, cujo título era: “A carne mais barata do mercado”, inspirado pela canção, “A carne”, interpretada pela saudosa Elza Soares.

Cansado de tanta atrocidade contra o negro, e contra a minha pessoa, pelo fato de ser negro, mais uma vez expus o meu repúdio a atos atrozes e que nos últimos quatro anos ganharam vozes, e em nome da liberdade de expressão, tornaram-se frequentes principalmente nas redes sociais. Tão logo, um dos colégios que leciono, aqui em Santa Catarina, deu tema à sua Semana Literária de “Africanidades”, buscando trazer à tona a discussão sobre essa temática, e mais do que isso, educar através do amor como bradou o grande líder negro, Nelson Mandela. O Estado de Santa Catarina, segundo o TJSC é o que mais registra casos de injúria racial no País. É lamentável. E embasados em uma cultura alimentada pela colonização europeia, muitos se aproveitam desse detalhe histórico e saem por aí cometendo os mais bárbaros crimes contra a população negra que por aqui é de 17%, uma vez que no Brasil somamos os 56%, ou seja, a maioria da população nacional.

Para esta Semana Literária conversamos com escritores acadêmicos, pesquisadores, professores, houve exposições e debates entre os discentes, além de uma série de manifestações culturais preparadas pelos próprios alunos para a composição de Semana Literária que se tornou uma tradição por aqui há quase uma década. Os alunos analisaram o conto machadiano, “Pai contra mãe”. Um exemplo de que Machado de Assis denunciou a escravização. Mas será que foi suficiente¿

Os alunos me pediram e fui eu escrever uma peça para eles ensaiarem e encenarem para apresentarem para o grande evento. Saíram-se muito bem. A peça foi aplaudida e reverenciada pela comunidade escolar e por muita gente que fez questão de prestigiá-la. Em um dos ensaios da peça recebo uma imagem dos meus irmãos, em seguida o amigo jornalista Gustavo Girotto já com um artigo elaborado por ele e o economista Rafael Anselmo sobre o lamentável fato do entregador Breno diante das ofensas racistas sofridas por parte de duas jovens e mais uma plateia que se deliciava com tais vis declarações expostas nas redes sociais pelas moradoras de Taquaritinga.

Em conversas com amigos aqui de Santa Catarina, os mesmos me indagaram se era mesmo a minha cidade que eu tanto exalto, não havia como dizer não, todavia a verdade estava escancarada, as racistas destilaram todo o seu fel demonstrando como o racismo se propaga e forma adeptos. E como na última crônica relatara toda essa onda perversa que ganha seguidores pelo País, resolvi novamente não ficar calado, e através da escrita, do exercício da demonstração dos fatos cotidianos, difundidos através da crônica, deixo aqui documentado toda a minha indignação e o mais profundo respeito ao Breno Danilo Kenmoti, 29 anos, vítima de tamanha brutalidade.

Não podemos mais aceitar como um erro, como estrutural, todo tipo de racismo imposto pela sociedade, principalmente em uma era de informação. São conscientes sim, como tais necessitam ser punidos, através do Poder Judiciário. As falas das jovens são claras e fere nossa alma, nossa dignidade. E devem arcar e responder por esse erro. É importante o pedido de desculpas, porém atrelar às ofensas com um momento de exaltação por parte das gurias é tentar colocar panos quentes numa situação que merece punição, na forma da lei, até para que outros não venham a cometer tal barbárie.

E cada vez mais é preciso colocar esta pauta em discussão, a fim de que o racismo não se propague e possa ser combatido através de políticas educacionais, propostas elencadas pela comunidade negra, além de um amplo serviço de conscientização através de Rádio, TV, Internet etc. Quanto mais o tema for discutido, trabalhado, lançado para o debate mais consciência nossa população terá. E caso insistam nas práticas racistas a Lei deve ser acionada e os acusados punidos. Nietzsche dizia que a dor cura a alma, porém será que não é a ausência de AMOR, que leva a tais práticas¿

Lutemos para a formação de uma sociedade antirracista.

P.S.: Além do artigo dos amigos Gustavo Girotto e Rafael Anselmo,  gostei muito da condução por parte do jornalista/radialista Auro Ferreira na entrevista que realizou com o advogado de defesa das meninas que cometeram tal barbárie.

* Sérgio Sant’Anna é Professor de Língua Portuguesa do Anglo e COC Professor de Redação da Rede Adventista e Jornalista.

**Os artigos publicados com assinatura não manifestam a opinião de O Defensor. A publicação corresponde ao propósito de estimular o debate dos problemas municipais, estaduais, nacionais e mundiais e de refletir as distintas tendências do pensamento contemporâneo.

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