Cinema: O farol é um pesadelo filmado com excelência

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Por: Carlos Eduardo Rici

O terror psicológico vem tendo um grande crescimento nas produções Hollywoodianas, como uma grande aposta para inovar o gênero. Um dos diretores que atualmente se enquadram na linha de frente dessa retomada do terror é Robert Eggers, diretor do aclamado A Bruxa, de 2015. Dessa vez, Eggers traz uma nova abordagem ao horror com seu conto de marinheiros, O Farol.

Estrelado por Robert Pattinson e Willem Dafoe, o longa conta a história de um jovem que na busca por um emprego que lhe garanta um futuro calmo, acaba tendo que passar 4 semanas ao lado de um velho que lhe servirá de mentor para que consiga no futuro comandar sozinho um farol. No meio desse tempo, coisas estranhas começam a acontecer na ilha isolada em que os dois homens estão presos.

A construção da solidez do filme é lenta e precisa de foco do espectador, pois nada apresentado pelo roteiro de Robert e Max Eggers é gratuito, por mais fútil que talvez possa soar em alguns momentos. O texto utiliza bem a linguagem abstrata e imaginativa, deixando os diálogos fugirem de construções diretas ou literais demais, o que abre para o público a possibilidade interpretativa que torna o filme mais poderoso quando entra em territórios pouco convencionais. E com um texto tão metafórico, o maior problema do filme ocorre em dois momentos de exposição verborrágica desnecessárias.

Há muita mitologia e até mesmo referências à contos de Lovecraft, sendo o próprio filme apto para se enquadrar em um desses contos. Na direção, Robert Eggers aposta nas atuações como ponto central na condução, mas não abandona o poder de guiar a história. Claro que a construção aqui não está somente em movimentos de câmera ou narrativa, e sim em como o todo, quando junto, cria uma obra extremamente sensorial. Ao assistir o filme, preste atenção em todos os detalhes, mas também deixe seus sentidos funcionarem, e irá aproveitar mais o que o filme tem a oferecer.

Como antigo diretor de arte, Eggers conhece bem o que uma linguagem física representa em um filme, por esse motivo, O Farol é construído com cenários extremamente detalhados. Mesmo se passando completamente em uma ilha isolada, é incrível notar como cada plano do filme enquadra um rico design de produção, que cria um mundo próprio para aquele lugar, além de trazer um mistério quando o diretor cria um contraste entre o espaço pequeno, os personagens e os objetos ao redor. Um perfeito exemplo de como usar a mise-en-scène.

Mas de nada adianta uma construção tão rica sem uma fotografia que acompanhe, e a fotografia é linda. As composições aqui são fotografadas por uma lente 35mm e a utilização de uma luz dura cria grandes contrastes de luz e sombra, que casualmente reforçam o estado de um personagem ou criam um sentimento de terror eminente. O uso de preto e branco e um formato de tela de 4:3 também são cirúrgicos e auxiliam o filme para que ele se assemelhe com uma obra antiga, mesmo que a qualidade da filmagem seja reconhecível.

Com todos esses truques para criar um terror psicológico de primeira, é óbvio que o design de som não ia ficar para trás. O som aqui é de incrível predominância, já que os diálogos aparecem de maneira pontual. O barulho da ilha, seja pelas ondas ou pela buzina do farol gritando na orelha dos personagens e do público. Seja a trilha sonora irritante e que arranha o cérebro. Todos elementos para causar desconforto. O Farol é um filme sobre declínio mental, e quando somos postos à ouvir todos esses sons tão incômodos, é quase como se Eggers quisesse que passássemos pelo mesmo que seus protagonistas.

E se você pensa que o show não poderia ficar melhor, as atuações te mostram o contrário. Robert Pattinson entrega um personagem cheio de traumas e suas diversas facetas são postas pra fora com cenas agonizantes e que exigem um esforço gigante para não cair em território de caricatura. É claro que para isso, Willem Dafoe auxilia Pattinson, já que seu personagem misterioso é magistralmente interpretado, deixando em suas cenas uma sensação de duvida e curiosidade desconfortáveis. Sequências incríveis se derivam de ambos atuando em conjunto.

O Farol é uma obra completa. Robert Eggers dirige seu texto sobre declínio psicológico com extrema excelência, sabendo utilizar as partes técnicas do filme ao seu favor. Como cinema de horror, o longa se sai extremamente bem, conduzindo o público à uma experiência sensorial com grandiosas atuações e um desconforto precioso, que te deixa extasiado pelo que acaba de assistir.

*Carlos Eduardo Rici é estudante e crítico de cinema.

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