Artigo: Ser completa é ter escolha – uma reflexão sobre a maternidade compulsória no século XXI

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Por: Isabela Nascimento*

Embora tenha amado brincar de bonecas durante toda a infância (atividade dada desde cedo para as meninas), em minha adolescência nunca idealizei casamentos ou filhos enquanto meta a ser alcançada. Essa mentalidade permaneceu em mim durante a vida adulta. E isso não quer dizer que tal vontade nunca aparecerá, assim como não é obrigação minha fazê-la surgir a qualquer custo. Assim, a palavra-chave deste texto publicado no dia internacional da mulher é: liberdade. Principalmente em relação à maternidade.

O termo “maternidade compulsória” – bastante comum em debates nas redes – consiste no “conjunto de práticas socioculturais e políticas que levam as mulheres a se tornarem ou desejarem ser mães, sem que isso represente de fato uma escolha.” Significa dizer que o modo como a sociedade foi construída, leva-nos ao entendimento de que a maternidade é inerente a toda e qualquer mulher, pois é historicamente romantizada, vista como forma de consagração feminina e de validação das mulheres enquanto seres humanos.

O crescimento das redes sociais também fez com que a maternidade fosse monetizada por muitas blogueiras e influenciadoras: basta observar o quanto se ganha virtualmente com postagens sobre gravidez, filhos e família perfeita. Essa narrativa entra no imaginário das adolescentes de modo bastante nocivo, principalmente quando pensamos na diferença social e econômica de quem faz as “publis” e de quem as consome.

O curioso é que toda essa idealização é prejudicial principalmente para as mulheres que são mães, uma vez que seus relatos dolorosos ou difíceis sobre a maternidade podem ser lidos negativamente pela sociedade que a rodeia. Significa dizer que: além de os direitos reprodutivos das mulheres serem constantemente cerceados em nosso país, não há abertura sincera para falar sobre a maternidade real em nossos espaços de convivência.

E se as próprias mães sofrem com a romantização da maternidade, aquelas que escolhem não ter filhos sofrem um tanto ainda maior. Diante de uma voz dizendo não, há várias outras vozes afirmando que “a mulher só é completa com filhos”, “quem não é mãe não sabe amar”, “casamento só se confirma com filhos”, “que todas são mais felizes sendo mães”, “que a verdadeira feminilidade está no maternar”, “quando vem o bebê?”, entre tantos outros comentários problemáticos.

Essa compulsão social em relação à maternidade acaba por atingir não só aquelas que possuem o direito da escolha, mas também às mulheres que não podem ter filhos biológicos ou que – por razões diversas – perderam a possibilidade de reprodução. Suas existências são anuladas? Inferiorizadas? Desvalorizadas? Os danos mentais podem ser muitos.

 Somos seres plurais. Nossas vontades, aspirações, modos de ser feliz, de amar e de conviver em sociedade também são diversos. E somos todos completos e completas, pois só a pele que nos habita sabe de nós. A verdade é que mulheres que não querem ter filhos não são mais nem menos sensíveis ou cuidadosas, tampouco são seres que abominam a maternidade, pelo contrário, muitas a enxergam como um ato lindo, sublime e admirável, só não desejam protagonizá-lo.

Neste 8 de março, desejo mais liberdade e respeito: para quem tem filhos, para quem os quer, para quem não quer e para quem nem sabe o que quer. Desejo mulheres livres, aos 20, aos 30, aos 40. Casadas, solteiras, enroladas. Dona de casa. Arquiteta. Jogadora. Professora. Advogada. Manicure. Mãe. Desejo que todas saibam verdadeiramente de suas escolhas, sem se deixarem levar pelo que pensa o outro, pelo que o relógio biológico aponta, pelo sonho paterno de terceiros. Meu carinho e admiração a todas as mulheres do Brasil.   

Citação: https://www.analuizadefigueiredosouza.com.br/post/maternidade-compulsoria-definicao-e-problematizacoes#:~:text=De%20modo%20mais%20simples%2C%20conforme,represente%20de%20fato%20uma%20escolha.

*Isabela Nascimento é Professora de Redação e Espanhol, Bacharela em Letras e Mestra em Estudos Literários.

**Os artigos publicados com assinatura não manifestam a opinião de O Defensor. A publicação corresponde ao propósito de estimular o debate dos problemas municipais, estaduais, nacionais e mundiais e de refletir as distintas tendências do pensamento contemporâneo.

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