Artigo: Fé corintiana

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Por: Carlos Galuban Neto*

Estou em um relacionamento abusivo com meu time do coração. Toda semana é a mesma coisa. Acordo pensando na partida, analiso os pontos fortes e fracos do adversário da vez, ligo a televisão, faço promessas para os santos que nem sei se existem, permaneço enraivecido por 90 minutos, fico insone, até que resolvo fazer a velha promessa: nunca mais fico assim por causa dessa droga de time – minha vida não muda em nada, perdendo ou ganhando.

A promessa dura tanto quanto aquela feita por Lula de que Marina Silva teria autoridade máxima em questões ambientais em seu governo.

Basta um suspiro, um mínimo sinal de vida, uma troca de passes mais elaborada, um chute que passou raspando a trave, para que eu me derreta e “tá bom, meu time merece mais essa chance”. E o ciclo de decepção se inicia novamente. O corintiano é uma eterna mulher de malandro.

Ultimamente, assistir a jogos do Corinthians tem sido como se deparar com acidentes na estrada: sei que a cena não será bonita, traumatizante até, mas paro tudo que estou fazendo para olhar a tragédia em andamento.

Colunas atrás, revelei-me agnóstico, diante da minha dificuldade de crer em algo sem evidências para tanto. Definitivamente, isso não se aplica à relação com o Corinthians. Não importa a profundidade do poço, eu sempre acredito que sairemos de lá a qualquer momento, ainda que a realidade não aconselhe qualquer otimismo.

Mesmo quando contratamos Vanderlei Luxemburgo, que não faz um trabalho decente há anos, mantive a secreta esperança no famoso “agora vai”. Não disse em voz alta, mas já imaginava, no final do ano, os analistas das mesas redondas falando da reabilitação do pofexô, no povo clamando por sua volta à seleção brasileira ou, quem sabe, em um retorno triunfal do Luxa ao Real Madrid. No ano seguinte, tamanho seu prestígio, Luxa voltaria a falar que é mais do que um técnico, é um “manager”.

 Oito jogos depois, é hora de cair na real: tal qual Lula, Luxemburgo fez muito sucesso há 2 décadas, teve diversas conquistas, foi amado por apoiadores e odiado por rivais, mas hoje seu único mérito é o de não ter no currículo os pecados de seu antecessor.

Para piorar, o arquirrival, o time que não deve ser nomeado, há anos ganha tudo sob o comando de Abel Ferreira. Não é possível que não haja um time decente na Europa querendo contratá-lo. Fosse técnico do Corinthians, algum sheik árabe já teria oferecido um caminhão de dinheiro e levado o sujeito embora só por ter vencido um Paulistão.

Desde Cabral, não havia um português que o povo brasileiro tanto desejasse que fosse embora. Mas ele ainda vai. Nesse dia, irei ao aeroporto para me certificar de que ele se foi mesmo. E o corintiano voltará a sorrir. Em nome de Deus Cássio Todo Poderoso, amém.

*Carlos Galuban Neto é advogado formado pela Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo.

**Os artigos publicados com assinatura não manifestam a opinião de O Defensor. A publicação corresponde ao propósito de estimular o debate dos problemas municipais, estaduais, nacionais e mundiais e de refletir as distintas tendências do pensamento contemporâneo.

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