Artigo: Meu aluno, nossos irmãos.

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Por: Prof. Sergio A. Sant’Anna*             

O aluno chegou à sala de aula, nessa nova forma de ensino – híbrido – e me disse:

            – Professor, retornei!

            – Que felicidade!

            Esse aluno voltara à sala de aula depois de quinze dias da sua mãe ter falecido vítima da covid-19. Ainda esperava pela recuperação do tio que se encontrava na UTI, também, vitimado pela mesma doença que ceifara a vida de sua irmã. Senti a tristeza no olhar daquele garoto que já não tinha o pai, sua voz embargada carregava a esperança, pela luta que a mãe travara com o coronavírus. Ele ainda foi capaz de me dizer:

            – Professor, decidi vir pra escola pois em casa a dor é maior.

            Parei, e comecei a refletir…a nossa importância diante deste momento devastador. A necessidade do professor. O guri perdera seus alicerces, estava junto da avó materna. Pai, Mãe e tio, suas referências, foram tragados pelo descaso de nossos governantes, cidadãos de bem, que zelam pelo negacionismo, difundem o tratamento precoce à base de remédios sem eficácia e debocham das mais de 500 mil mortes. Onde foi que deixaram à compaixão, o altruísmo, o amor que tanto é propagado?

            O ser humano é mal por natureza, e quando essa maldade é alimentada, como acontece hoje, vem à tona aquele ser que esperávamos que não surgisse, mas que sabíamos que existia. Esse ser invejoso pela sua trajetória de desafios e conquistas, esse ser mesquinho, capaz de esconder-se diante das maiores atrocidades mundanas, esse ser inescrupuloso, que mata só pelo desejo de ver o mais fraco dizimado, esse ser que adentra à igreja hoje e amanhã sai falando mal de tudo e de todos. O pecado são os outros. Não se esqueça, cidadão de bem, que Lúcifer foi um ser de luz…

            – Professor, eu posso falar? Pediu-me com sua voz intimidada.

            – Queres falar? É claro que sim!

            – Queria aproveitar e pedir para os meus colegas e seus pais que estão por trás das câmeras para continuarem usando máscaras, cumprir a higienização e, quando, tiverem que sair de casa, tomem cuidado, previnam-se…

            Os alunos que se encontravam de maneira remota, calaram-se. Olhos diminuídos e embaçados pelas lágrimas que se enfileiravam-se. Os pais choravam compulsivamente; na sala, os poucos alunos, eram só tristeza. A dor do outro era deles, era nossa…eu sem palavras, tive vontade de abraçá-lo, porém havia a necessidade de seguir os protocolos. A mãe deste meu aluno pegara a doença ao sair para o trabalho, pois era a única fonte de renda naquele lar. Naquele momento pensei nas milhares de famílias enlutadas, nos milhões de brasileiros que se encontram em situação de extrema pobreza, e aqueles, que igualmente a você e eu, necessitam trabalhar, pois com certeza teremos outros alunos para afagar, para ensinar e semear o amor.

            Agora me pergunto: como pode dormir nosso atual presidente da República, seu cercadinho, e aqueles que disseminam inverdades e zombam das vítimas da covid-19? Eles contemplam o seu entorno? É lamentável que não zelem pela vida.

*Prof. Sergio A. Sant’Anna – Professor de Redação nas Redes Adventista e COC em SC e jornalista.

**Os artigos assinados não representam a opinião de O Defensor!

 

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