Artigo: Mais artes além da sétima

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Por: Rodrigo Segantini*

No século XIX, o filósofo alemão Friedrich Hegel dividiu as artes em seis expressões: arquitetura, escultura, pintura, música, dança e poesia. O pensador entendia que era possível compreender a arte como a representação do sentimento humano em sua relação com o espaço (por meio da pintura, escultura e arquitetura) e com o tempo (através da música, dança e poesia). Algumas décadas depois, a essa lista foi incluída a chamada sétima arte: o cinema.

Foi o artista italiano Ricciotto Canudo que classificou o cinema como “sétima arte” pela primeira vez, isso em 1923. Para ele, o cinema era constituído por elementos de outras expressões tais como o som da música, o movimento da dança, as cores da pintura, a plástica da escultura, o ritmo da poesia e a estrutura da arquitetura. Enfim, uma arte híbrida, mas de natureza única.

Mesmo que hoje podemos dizer que modernamente temos outras formas de expressão artística como como fotografia, quadrinhos, jogos e arte digital, nada abalou a posição do cinema como sendo a “sétima arte”. Tenho certeza absoluta que, mesmo sem saber quais são as outras seis artes ou quem criou esse rol de classificação, o amigo leitor sabia qual era a posição do cinema.

Taquaritinga já teve várias salas de cinema. Nos áureos tempos, havia o Cine São Pedro, em frente à praça 09 de Julho (atual praça Horácio Ramalho) e o Cine São Benedito, no Farwest. Mas, com o tempo, os dois foram fechados. O Cine São Benedito, da família Abbud, deu lugar a uma sorveteria. O Cine São Pedro, da família Curti, resistiu por mais tempo: depois que teve suas atividades encerradas nos anos 90, voltou a funcionar graças a um grupo de abnegados liderados pelo arquiteto Guilherme Franco até 2006, quando técnicos da prefeitura interditaram o prédio porque havia a possibilidade de seu teto desabar.

Acompanhei de perto a saga do Cine São Pedro desde então. Como a família não tinha mais interesse na manutenção da propriedade, para evitar que o imóvel secular fosse perdido na mão de algum particular que o colocasse no chão, o então prefeito Paulinho Delgado decidiu desapropriá-lo e, na sequência, promover sua reforma e restauração para colocá-lo de volta em funcionamento, desta vez como um centro cultural. A gestão de Paulinho Delgado fez um esforço hercúleo para encontrar os quase 40 proprietários do prédio e para pagá-lo; depois, com o apoio e os trabalhos do então deputado Dimas Ramalho, conseguiu os recursos para reformar suas instalações para que pudessem ser utilizadas de novo, mas respeitando sua arquitetura imponente.

Mas, tão logo Paulinho Delgado deixou a prefeitura, parece que resgatar o Cine São Pedro deste limbo em que ele se encontra deixou de ser uma prioridade. Na verdade, as políticas culturais da cidade foram fulminadas pelo descaso, com o fechamento do Museu José Martins Sanches Filho e o descaso com a Biblioteca José Paulo Paes. Com o tempo, esse desmonte, que causou certo furor popular, foi sendo assimilado e o povo foi deixando de lado qualquer possibilidade de levante contra essa afronta a sua memória.

A Prefeitura tem anunciado que a obra do Cine São Pedro será finalmente concluída – pelo menos parcialmente – e que finalmente o prédio voltará a ser utilizado – mesmo que parcialmente. Mas, se o cinema é a sétima arte, precisamos lembrar que as outras seis manifestações artísticas precisam ser lembradas também para que possamos exigir que nosso museu e nossa biblioteca tenham prioridade nesta retomada do uso do amado prédio histórico.

*Rodrigo Segantini é advogado, professor universitário, mestre em psicologia pela Famerp.

**Os artigos publicados com assinatura não manifestam a opinião de O Defensor. A publicação corresponde ao propósito de estimular o debate dos problemas nacionais e mundiais e de refletir as distintas tenências do pensamento contemporâneo.

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