Erga Omnes – Precedentes judiciais e investimento externo

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Por: Gustavo Schneider Nunes*

O ser humano necessita de previsibilidade para desempenhar com segurança as suas ações em todas as áreas da vida, na medida em que as pautas de conduta extraídas orientam as pessoas a adotar esse ou aquele caminho para a tomada dessa ou daquela decisão.

No ramo dos negócios isso não é diferente. Por exemplo, uma empresa estrangeira interessada em expandir os seus negócios na América Latina, certamente estudará os pontos nodais de cada um dos possíveis países que tem em mira, com o propósito de se certificar se há um padrão de segurança jurídica tal que a tranquilize no processo de tomada de decisão.

Para tanto, o “fator Judiciário” pode ser decisivo. Não que o Judiciário deva se preocupar em angariar investidores externos. Não. Não é disso que se cuida nem o que se pretende. No ponto, o que se exige do Judiciário é que haja previsibilidade decisória, de modo que casos semelhantes sejam julgados de igual modo, não havendo mudança repentina e injustificada de posicionamento. Não se pode admitir que um juiz lance mão de uma decisão conforme a sua consciência, desprezando essa integridade do Direito, da qual faz parte a Constituição Federal, os Tratados Internacionais, as leis, os precedentes judiciais e os negócios jurídicos. 

Exige-se coerência decisória. Estando presentes as mesmas razões de decidir, a decisão não pode ser outra que não aquela anteriormente proferida. O comportamento posterior deve ser coerente com o compartimento anterior. A prática de comportamentos contraditórios contribui para a quebra de confiança da sociedade para com o Judiciário.

Se eu nego um doce ao meu filho antes do jantar, não posso entregar tal doce para a minha filha, estando ela a vivenciar exatamente as mesmas condições. Se um professor se recusa a aceitar a prova de um aluno depois de encerrado o tempo de determinada atividade avaliativa, não pode, igualmente nas mesmas condições, receber, em situação contraditória, a prova de outro aluno, por ter por este maior predileção. Se um árbitro de futebol expulsa um jogador do time C que o ofendeu com palavrões, não pode deixar de também expulsar o jogador do time P que agiu de idêntica maneira.

Exige-se coerência no uso dos critérios decisórios.

E aqui, por conta dos tempos bicudos em que vivemos, requer que seja feita uma observação: não se está criticando a atuação do Judiciário, do STF, do juiz A ou B, com o propósito de eliminá-los, tão ao gosto de algumas pessoas autoritárias, pois – e isso é fundamental que se diga –, na democracia, toda crítica que se faz às instituições deve ter a finalidade de fortalecê-las e não de destruí-las.

Se um tributo y recolhido por empresas do setor é ora declarado constitucional ora declarado inconstitucional pelos tribunais brasileiros, ou se uma questão trabalhista é ora decidida de uma forma ora de outra, esse cenário de instabilidade torna-se nocivo para variadas situações da vida. Ninguém de boa-fé ganha com ele. Investidores enxergam nisso um sinal vermelho indicativo de que algo está muito fora do planejado. Eles sabem que todo negócio tem riscos que lhe são inerentes. Entretanto, também sabem que quanto mais riscos forem eliminados, melhor. Com a existência de pautas de conduta bem definidas e que perduram no tempo, todos têm a ganhar, por conseguirem planejar e antever ações.

* Gustavo Schneider Nunes é advogado, professor e doutorando em direito pela UNAERP.

**Os artigos publicados com assinatura não manifestam a opinião de O Defensor. A publicação corresponde ao propósito de estimular o debate dos problemas nacionais e mundiais e de refletir as distintas tenências do pensamento contemporâneo.

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