Artigo: Crônicas, cronistas e hebdomadários

Compartilhe esta notícia:

Por: Prof. Sergio A. Sant’Anna*

O gênero textual crônica sempre fez parte do meu cotidiano. Meu pai, Luiz Sant’Anna Netto, jornalista, tinha na crônica o seu paradigma e nos cronistas sua inspiração. Ao ser levado para as redações dos jornais, os quais ele trabalhara, aprendi a observar aquele gênero que nascera numa redação de jornal e foi especializado ali. Olhava como aqueles escritores do dia a dia comportavam-se, o que liam, quantos cigarros fumavam, quantas folhas jogavam ao lixo depois de datilografarem algumas laudas nas olivettis. Do “Ao correr da pena”, de José de Alencar – autor fundador da prosa romântica, indianista em muitas das suas obras, mas crítico fervoroso da sociedade imperial, o cearense inaugurou no Brasil um gênero nascido aqui, nas terras de Peri e Iracema, assim como o samba de Donga e Chiquinha Gonzaga.

Sou amante da crônica brasileira. Iniciei minhas leituras da análise do cotidiano pela coleção “Para Gostar de Ler”, da Editora Ática, que reunia: Carlos Drummond de Andrade, Fernando Sabino, Paulo Mendes Campos e Rubem Braga e suas crônicas. Essa foi a obra número um, depois a editora lançou e relança ainda hoje estes ícones da escrita cotidiana. Nelson Rodrigues, Machado de Assis, Lima Barreto, João do Rio, Mário Prata, Caio Fernando Abreu, Raquel de Queiróz, Ignácio de Loyola Brandão fizeram parte desse meu universo de cronistas. Formaram-me. Fizeram-me refletir.

Lembro muito de às quartas-feiras esperar pelo Mário Prata e, também, pela autora de “O quinze”, e primeira mulher a ocupar uma cadeira na ABL (Academia Brasileira de Letras), Raquel de Queiróz. Cronistas do jornal “O Estado de São Paulo” eram os meus favoritos. Fiz questão de comprar o livro “Cronistas do Estadão”, apesar da Biblioteca Municipal “José Paulo Paes” possuí-lo em seu acervo. O Caio Fernando Abreu li suas análises cotidianas por pouco tempo, pois em 1996 ele se despediu desta vida. Depois veio o Daniel Pizza, que mandava muito bem nestas crônicas culturais. Essa mescla do Jornalismo com a Literatura. Um pouco de Truman Capote. Mas, confesso mesmo ser apaixonado pelas histórias do Ignácio de Loyola Brandão – magnífico. Principalmente quando ele falava de Araraquara, da ferrovia, do time de futebol Ferroviária e suas primeiras experiências quando chegou na cidade de São Paulo. Até hoje carrego os blocos de notas feito às cadernetas que o araraquarense dizia que tínhamos que carregar para anotarmos nossas ideias.

Sim. Hoje leio muita crônica. Pesquiso sobre. Minha profissão deu-me elementos para analisá-las, todavia é necessário a leitura. Sinto falta do Rubem Braga. Li suas crônicas postumamente. Tenho várias obras que carregam o seu lirismo diante da prosa. O papa da crônica. Sua Cachoeiro do Itapemirim não é esquecida, assim como a Itabira de Drummond (que já escrevi por aqui) e a Salvador de Jorge Amado. Essa narração carregando o tempo psicológico diante das crônicas, é o que as tornam vivas. Armando Nogueira e Nelson Rodrigues também sabiam fiá-las. Mestres na crônica esportiva? Também. Mas, a intertextualidade era tecida com uma carga enorme de informações. Quanto prazer… Leio Juca Kfouri, porém ainda falta. Ele não preencheu esse vazio. E não deve ter esta pretensão. Ídolos não morrem, ficam cravados em nossos corações. Assim fez Millôr. Modelo. Gênio. Esses dias um aluno insinuou a comparação com José Simão da “Folha de São Paulo”. Disse apenas: “Distantes”. Embora, Simão seja genial. Antônio Prata (filho de Mário Prata, que tive o prazer de conversar numa Feira do Livro em Porto Alegre), Fernanda Torres, Tati Bernardi, Xico Sá, Duvivier, Maria Ribeiro, Leandro Karnal são atuais e ainda me reavivam a vontade de ler um bom e belo escrito do cotidiano.

P.S.: Li uma crônica fantástica, semana passada, do jornalista Nilton Morselli, uma preciosidade, real análise do cotidiano – a verdadeira crônica. Foi aí que me surgiu a ideia de esboçar este texto, que está mais para Artigo, nas páginas deste real hebdomadário.

*Prof. Sergio A. Sant’Anna – Professor de Redação nas Redes Adventista e COC em SC e jornalista.

**Os artigos assinados não representam a opinião de O Defensor!

Compartilhe esta notícia: