Erga Omnes – Negociação no Direito

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Por: Gustavo Schneider Nunes*

No filme História de um casamento, Nicole (Scarlet Johansson) e Charlie (Adam Driver) queriam um divórcio consensual e respeitoso para que o fim do relacionamento não interferisse na boa relação que sempre tiveram e que pretendiam também manter no futuro, em especial em razão de Henry (Azhy Robertson), filho do casal.

Entretanto, a advogada Nora Fanshaw (Laura Dern), contratada por Nicole, deu um direcionamento ao caso em sentido oposto ao que foi idealizado no início e, a partir daí, Charlie sentiu-se compelido a contratar um advogado do mesmo estilo, Jay Marotta (Ray Liotta), um verdadeiro urso faminto pronto a atacar suas presas.

Ambos os advogados tiveram uma atuação hostil durante todo o processo judicial. Para eles, o que importava era a vitória de um sobre o outro, custasse o que fosse preciso, jamais se importando com a lesividade das armas usadas ou com os danos colaterais daí resultantes.

Não vou (mais) dar spoiler sobre o filme, porém, o certo é que a atuação dos advogados foi decisiva para que o casal se afastasse do propósito inicialmente desejado quase a ponto de colocar tudo o que se podia ainda preservar a perder.

Trata-se de um modo de atuação profissional a ser superado e que não deve encontrar mais espaço nos dias de hoje. As partes envolvidas no litígio devem tentar solucioná-lo prioritariamente por meio da autocomposição. Apenas no caso desta tentativa se mostrar infrutífera é que se deve buscar a solução com a prolação de uma sentença judicial ou arbitral. Há uma substituição da cultura da sentença pela cultura da pacificação (Kazuo Watanabe, in Cultura da Sentença e Cultura da Pacificação).

E, para que isso ocorra de modo produtivo, as partes e os advogados que as representam não devem assumir uma postura belicosa tal como estivessem em uma guerra. Ao invés de um comportamento rígido e fechado à possibilidade de uma solução negociada, torna-se muito mais produtivo manter o foco na resolução do problema, ouvir os argumentos adversos de forma respeitosa e ser firme na defesa das convicções que defende (Willian Ury, Roger Fischer e Bruce Patton, in Como Chegar ao Sim). Em suma: a gentileza com o adversário não inviabiliza a firmeza na defesa dos interesses próprios, sem que precise abrir mão de princípios.

Além disso, torna-se indispensável utilizar uma comunicação não violenta (Marschall Rosemberg, in Comunicação Não-Violenta). Em uma negociação jurídica, assim como em diversos aspectos da vida, a forma como a pessoa se comunica pode facilitar ou complicar as coisas. Uma palavra mal colocada ou o tom da voz agressivo podem ser suficientes para que as coisas caminhem para um lugar indesejado.

Por isso, os fatos devem ser observados sem julgamento. Posteriormente devem ser avaliados, com a identificação dos sentimentos e o reconhecimento desses sentimentos atrelados a necessidades, para, enfim, formular o pedido almejado.

Um bom profissional do Direito deve estar atento a isso tudo, porque contribui para a intensificação das chances de um acordo vantajoso, e, mais do que isso, ajuda a preservar relacionamentos duradouros e que as partes possam desejar manter no futuro, como ocorre em questões envolvendo o direito de família e o direito empresarial.

Portanto, para enfrentar os problemas contemporâneos, não se pode olhar o novo com os olhos do passado, porque, se assim for, as chances de manter-se no mercado de trabalho ficam reduzidas e os clientes não obterão uma proteção adequada aos seus direitos. É tempo de adaptação.

*Gustavo Schneider Nunes é advogado e Professor

**Os artigos assinados não representam a opinião de O Defensor!

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