Artigo: Argumentos, doxas e falácias

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Por: Prof. Sergio A. Sant’Anna

Poder argumentar é o apogeu do exercício democrático. Todavia, mais que se expressar através de argumentos, faz-se necessário saber o que é argumentar para não ser tragado pelo canto envolvente das falácias. Os zurros e sibilos proliferaram-se nesses últimos anos e adquiriram, segundo as doxas, o status de “argumentum”, levando o cidadão a uma falsa concepção do que realmente é argumentar.

Diferente do que acontecia na “Paideia”, o Sistema Educacional Brasileiro, hoje, morre de amores pela memorização, elimina a capacidade do discente de se expressar e concorre, palmo a palmo, com a ludibriante tecnologia. Resultado: alunos informados pelo “infomar”. Ou seja, incapazes de justificar o porquê da resposta dada, insuficientes diante da exposição de dois parágrafos argumentativos sobre temas do nosso cotidiano em um texto dissertativo-argumentativo exigido pelo ENEM. De fato: não navegam, naufragam. Consequentemente acabam devorando qualquer conteúdo zumbido por um “youtuber”, espalhados por esses canais amontoados pela internet e elencam, hierarquicamente, como fontes de informação. Doces mentes incapazes. Este último adjetivo, pois não são orientados a exporem suas posições, muito menos testarem seu poder argumentativo diante de um debate, e sabem por que isso não acontece? Porque aquele que o deveria orientar foi adestrado apenas a memorizar. Sabe todas as capitais dos estados brasileiros, porém não são capazes de se localizarem geograficamente. Também, aquele que o orienta, é capaz de dizer quais os livros a serem seguidos para a produção de um texto dissertativo nota 1000, contudo não é capaz de elaborar um texto dissertativo-argumentativo mediano, pois só a teoria fez parte do seu cotidiano.

Os profissionais que hoje se apresentam, principalmente aqueles que lidam com a argumentação, carregam na arte de argumentar apenas o legado da expressão, elemento impotente quando falamos em convencimento, ou seja, ser capaz de fazer com que o outro mude de opinião ao se surpreender com a sua monumental lista de elementos argumentativos. Para argumentar necessitamos de dois elementos fundamentais: o convencimento é um deles. Lida com o reconhecimento de uma verdade, portanto, caminha de mãos dadas com a razão. Relaciona-se com provas. Fatos, números, dados, materialidade são essenciais para o convencer. Lembrando que o ato de convencer não é uma guerra, mas a capacidade de vencer com, em parceria com o seu interlocutor. O outro se trata da Persuasão, ou seja, aquela que faz com que o interlocutor mude de comportamento. É o manipular em ações. Persuadir significa que através da deusa romana “Suada” (deusa da persuasão) ludibriaremos aquele com quem argumentamos. Logo, razão e emoção são essenciais para a formação do argumento. Sem um desses dois elementos a argumentação torna-se inválida e imprecisa, anulando o emprego desse sinônimo.

Hoje, os argumentos tentam se expandirem através das redes sociais, pegando carona com a proliferação da ignorância e o disseminar, de forma orquestrada, dos discursos falaciosos. A falácia tem como base a mentira, porém não pode ser desconsiderada desse campo argumentativo, pois mesmo convivendo com a hipocrisia, alimentada pelo jogo sujo, serve de base para discursos negacionistas, para a pós-verdade que tanto nos incomoda e alimenta uma legião de adeptos e usuários. Realmente, entorpece. É devastadora. Mata uma geração. Interrompe o progresso. Estimula a corrupção. Dá asas aos insanos. Embrutece um país. Emerge a irracionalidade.

A doxa (d-o-k-s-a) é a sabedoria popular, crença comum, aquela que alimenta o imaginário de várias gerações populares, esteve presente durante a nossa comunicação oral, porém não há como negar à sua importância, mesmo que Platão a coloque como antônima ao conhecimento acadêmico. Entretanto, ela não deixa de ser importante no processo argumentativo. E não deve ser totalmente desmerecida como a falácia, esta, totalmente elaborada e maléfica. A doxa continuará a fazer parte do nosso cotidiano, alimentando diversas das nossas histórias populares, do nosso folclore.

Não podemos mais ser tragados pela sedução apenas persuasiva, uma forma de argumentação; ou pela falácia frequente nos discursos de Chefes de Nações, que dominados pela imprecisão vocabular, a ausência de argumentos e o destempero para com os seus interlocutores, utiliza-se desses mecanismos chulos para angariar seguidores, lapidar fãs e conduzir uma manada. Esta que não se cansa de passar vergonha. Eles nem argumentam mais. Será que algum dia argumentaram?

*Prof. Sergio A. Sant’Anna – Professor de Redação nas Redes Adventista e COC em SC e jornalista.

**Os artigos assinados não representam a opinião de O Defensor!

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