14 de novembro de 2024
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Artigo: Populismo e Insustentabilidade

Por: André Naves*

Populismo costuma ser entendido como o conjunto de práticas e condutas políticas em que o líder da Nação estabelece uma relação direta, imediata e desinstitucionalizada com as massas populares, em contraste e contrapondo-se a uma suposta elite. Em resumo, o líder populista aposta no aprofundamento da conflituosidade entre os incluídos (“nós) e os excluídos (“eles”), transformando esse atrito em retórica justificadora de políticas públicas exclusivistas.

O poder de sedução inerente ao populismo reside nesse fato. Como o líder se apresenta como um integrante comum do povo, assume-se como verdadeira a aparência de que ele compreende os problemas sociais e os pode solucionar. Acontece que decorre do próprio pensamento populista o imediatismo, já que problemas estruturais e complexos são reduzidos a questiúnculas simples e menores que ainda padecem de solução por exclusiva falta de vontade. Daí saídas curtoprazistas e desplanejadas para as graves mazelas sociais.

Contrapondo-se ao charme sedutor do populismo, políticas públicas que efetivamente resolvam as questões da sociedade são aquelas racionalmente planejadas, que, geralmente, não dão frutos imediatos. Ao contrário, questões complexas são solucionadas por medidas igualmente complexas, que só produzem efeitos com a continuidade, no longo prazo. Ou seja, são políticas que, ao revés de seduzir e apaixonar, devem convencer.

Esse convencimento daquilo que efetivamente soluciona os problemas deve ser buscado pela ampliação do diálogo, por meio da pluralidade de ideias e da inclusão. Cada indivíduo, portanto, de acordo com suas características intrínsecas, experiências pessoais e relações com as diversas coletividades, deve participar do debate público no sentido de construir as políticas que verdadeiramente superem as deficiências sociais.

Só assim, pelas luzes da razão e oposição às trevas das paixões e do populismo, será possível caminhar para além de práticas cosméticas que, ainda que perpetuem injustiças, são atenuadas enquanto soluções definitivas.

Nesse sentido, governos de matiz populista são completamente inábeis a construir políticas sustentáveis, que atendam aos requisitos e aos valores do paradigma “ESG”. Muitas vezes, para o florescimento de políticas sustentáveis, a inclusão, a pluralidade, e a fermentação planejada ao longo do tempo se fazem necessárias. A análise de diversos pontos de vista é fundamental ao desenvolvimento de atitudes sustentáveis. Dessa forma, a democracia liberal, enquanto potencializadora da institucionalidade social, é essencial à sustentabilidade. Por outro lado, o populismo, ao preconizar uma série de benefícios efêmeros e imediatos, é insustentável.

Seja pelo projeto do “Green New Deal” nos Estados Unidos, que visa à retomada econômica e ao fortalecimento do mercado de trabalho, ao mesmo tempo em que opções produtivas ambientalmente sustentáveis são privilegiadas; seja pelo programa de transformar a França em uma Nação Ecológica proposto por Macron em seu discurso de vitória; seja pela transição energética anunciada pelo Japão e pela Alemanha, que visa cambiar a dependência do gás russo por opções mais limpas, encabeçadas pelo hidrogênio “verde”; percebe-se que uma política harmônica à conservação do patrimônio natural só pode ser construída harmonicamente por uma ação democrática e liberal, que, entre outras práticas, favoreça a concertação internacional, objetivando o aprofundamento da globalização.

Seguindo essa mesma linha de raciocínio, o governo do Reino Unido encomendou à Universidade de Cambridge, sob coordenação do Professor Sir Partha Dasgupta, um relatório sobre as potencialidades econômicas da sustentabilidade, em que foi concluído que a degradação ambiental, ao afetar o acesso à água, à alimentação e aos serviços públicos de qualidade, aprisiona os seres humanos na armadilha da pobreza ambiental.

Resumindo: enquanto as alternativas populistas são ambientalmente nocivas, socialmente precarizantes e governativamente opacas, as opções liberal-democráticas provam que desenvolver os valores “ESG” é, em última análise, cuidar das pessoas.

*André Naves é Defensor Público Federal, especialista em Direitos Humanos e Sociais. Escritor, professor e palestrante.

**Os artigos publicados com assinatura não manifestam a opinião de O Defensor. A publicação corresponde ao propósito de estimular o debate dos problemas municipais, estaduais, nacionais e mundiais e de refletir as distintas tendências do pensamento contemporâneo.