22 de novembro de 2024
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Salve, Carolina Maria de Jesus!

Por: Prof. Sergio A. Sant’Anna*

No último sábado (27), assistia a um quadro do programa “Caldeirão do Huck” chamado “A parede”. Sou cooptado por histórias, narrativas envolventes, principalmente daqueles que lutam em prol dos seus semelhantes.

Duas mulheres: uma médica, 41 anos; outra, advogada com 29 anos. Competiam pela ONG que eram membros, um projeto espetacular, favorável aos indígenas da Região Amazônica. Ali lembrei-me, através da fala da médica, de uma crônica do genial Rubem Alves em que fala do processo da “escutatória” – das nossas atitudes, que apenas permitem que falemos. O diálogo proposto por Sócrates (uma das minhas paixões lítero-filosóficas) era deixar que o outro pudesse falar, então, a necessidade desse processo de escuta. E a médica relatou, que o ato de escutar à população indígena é o mecanismo vital nesse processo de ajuda aos nossos primeiros habitantes.

Atento aos questionamentos realizados pelo apresentador à dupla, apreciava às perguntas objetivas com direito à quatro alternativas como respostas. Uma dessas questões chamou-me atenção, tratava-se da autoria da obra “Quarto de despejo” de 1960. Entre as opções de resposta a televisão apresentava: Clarice Lispector, Cecília Meireles, Cora Coralina e Carolina Maria de Jesus. Confesso ter explodido de alegria ao ver a Literatura Brasileira desfilando em um programa de entretenimento com milhões de espectadores num sábado. Porém, ainda estamos longe de um Brasil de leitores. Embora a evolução e difusão da Literatura Nacional aconteça, percebe-se que a valorização, ainda, é para autores considerados como clássicos. A resposta da advogada foi Clarice Lispector – nome forte e impactante da nossa literatura, todavia incapaz de contar às agruras, dificuldades e conviver com as dificuldades enfrentadas por Carolina Maria de Jesus. Em meio a essa turbulência, a antiga moradora da extinta favela do Canindé coletava lixo e desses lia os livros e escritos perdidos. Foi do lixo que Carolina narrou seu “Quarto de despejo”, foi dele que as ideias surgiram, foi dali que a descobriram.

Hoje, Carolina Maria de Jesus desfila por inúmeros exames vestibulares, sua obra ganha centenas de análises e ultrapassa fronteiras. Mesmo que o apresentador Luciano Huck não saiba quem foi essa brilhante autora, Carolina é inspiração e paradigma para milhões. Reconhecida tardiamente e condecorada no mês de fevereiro deste ano como Doutora Honoris Causa pela UFRJ, a autora negra de “Quarto de despejo” é o exemplo mais significativo e vital dos últimos tempos diante da nossa Literatura Brasileira.

Que nossas escolas e universidades possam abrir às portas da leitura as nossas escritoras, aos negros, favelados, extinguindo com o estereótipo determinista, que torna nossa sociedade ainda mais preconceituosa. Fazer com que nossos discentes conheçam escritores como Carolina Maria de Jesus, Maria Firmina dos Reis, Conceição Evaristo, Jeferson Tenório, Mano Brown, Sérgio Vaz etc. Lutemos para que nossa essencial literatura seja difundida e reconhecida.

*Prof. Sergio A. Sant’Anna – Professor de Redação nas Redes Adventista e COC em SC e jornalista.

**Os artigos assinados não representam a opinião de O Defensor!