Em Tempo – Exílio voluntário: rumo ao “País das Maravilhas”
Por: Prof. Gilberto Tannus*
O ministro do stf alexandre de moraes decretou a prisão do jornalista Oswaldo Eustáquio. A pf o trancafiou. Sob quais acusações? Ignora-se. Mistério dos mistérios… Como se previsse tolices, encarnando o papel de Nostradamus tupiniquim, o saudoso poeta Mário Quintana há décadas versejou: “Deixem o outro mundo em paz! O mistério está aqui!”. Exato, senhor Quintana. Está aqui, e mais precisamente nas absurdas páginas do destrambelhado processo das fake news, criado pelo ministro dias toffoli e colocado em prática por moraes – o Torquemada de toga.
No país do faz de conta da justiça brasileira Eustáquio foi preso sem saber do que está sendo acusado. (Vide “O Processo”, de Franz Kafka). Aliás, o advogado Elias Mattar Assad não conseguiu ter acesso aos autos do processo. Ou seja, o advogado de defesa não sabe ainda do que terá de defender seu cliente já encarcerado!
O que está mal, pode piorar? Decerto que sim. Senão vejamos. Nem o delegado e os policiais cumpridores da ordem do juiz do stf, sabem o porquê da detenção de Oswaldo Eustáquio. Desculpam-se: apenas cumprimos ordens.
(Temendo abusar da sua paciência, o amigo leitor permite-me um parêntese histórico? Obrigado. adolf eichmann foi chefe da Seção de Assuntos Judeus no Departamento de Segurança de hitler. Terminada a guerra, foi julgado em Jerusalém, acusado de crimes terríveis. Por exemplo: “em 1944 foi mandado à Hungria para organizar a deportação de 800 mil judeus. Em dois meses eichmann despachou 147 trens que levaram 434 mil pessoas para as câmaras de gás de auschwitz”. Ele conhecia o destino dos prisioneiros. O julgamento, transmitido pela televisão, chocou os que o assistiram. Esperavam “ver um monstro, um antissemita brutal, um nazista fanático”. Viram somente “a imagem de um burocrata que teria apenas assinado documentos (…), um subalterno de pouca iniciativa própria e sem senso de responsabilidade”. Confrontado com seus crimes, reputados cruéis e contra a humanidade, eichmann – sem expressar o menor arrependimento, remorso ou sentimento de culpa – justificou-se: “Apenas cumpri ordens”. Tentando conceituar esta fria indiferença psicológica e emocional do indivíduo diante da prática pessoal de atos de barbárie ética e moralmente condenável, a filósofa Hannah Arendt criou a expressão “banalidade do mal”, usada em seu livro “eichmann em Jerusalém”).
Já o renomado jornalista J. R. Guzzo, referindo-se à prisão arbitrária de Oswaldo Eustáquio, escreveu: “Os jornalistas que aplaudem ou aceitam passivamente a violação dos direitos e das liberdades individuais por parte do judiciário, inclusive a liberdade de imprensa, terão de fazer um acordo com as suas consciências para ficar em paz – ou para fazer de conta que está tudo bem”.
Rapaz! Entre viver no universo surreal da prostituída justiça brasileira – onde a constituição é estuprada incontáveis vezes por seus próprios guardiões – ou pedirmos asilo político no “País das Maravilhas” de Alice, melhor ficarmos com a segunda opção. Garanto-lhe, leitor, que o amalucado reino da Rainha de Copas é milhões de vezes mais racional do que o Brasil contemporâneo sob os despautérios jurídicos do stf…
*Prof. Gilberto Tannus é mestre em história pela Unesp