Diversificação é o caminho para que pequenas propriedades garantam maior rentabilidade
Em função de uma escolha de vida que se tornou muito apropriada frente à pandemia atual do novo coronavirus, que causa a doença Covid-19, com a consequente interrupção de vários negócios, o produtor rural de Tietê, Jamil Rodrigues Zampaulo, proprietário do Sítio São João, conta a sua experiência e escolhas que, nos tempos atuais ou em tempos normais, o levaram, como proprietário de áreas pequenas, a se inserir no mercado e vir mantendo uma clientela fiel aos seus produtos. “Estamos nos adequando a cada semana, na primeira os pedidos foram normais; na segunda o restaurante em Itu passou a fazer apenas ‘quentinhas’ para entrega e como muitos estão preparando refeições em casa, houve redução. Em relação às entregas em condomínios, estamos providenciando um grupo no WhatsApp para atender as compras diretas, seja retirada no próprio Sítio, em Tietê, quanto em Salto, onde resido. Dividi a semana em quatro dias (sexta a segunda) em Tietê e de terça a quinta em Salto, assim não deixamos ninguém sem atendimento”, conta Jamil.
O telefone para pedidos tem sido a ferramenta para atender na região que abrange Salto, Itu e Tietê. Jamil diz que dessa forma vai se organizando para não deixar sua clientela sem atendimento, fazendo isso de forma correta, com máscara, luva e cuidados com a higienização adequada. “Precisamos nos reinventar neste período e nos adequarmos para que possamos continuar na atividade”, conta o produtor. Em relação aos planos de aumentar a infraestrutura tanto na questão do gado, com melhoria genética e reforma de instalações, quanto na troca de parte do plantel das galinhas poedeiras, ficam para depois. Agora o momento é de investir no delivery e não perder os clientes conquistados ao longo do tempo.
As opções de um professor que se tornou um produtor
A diversidade nas atividades e o planejamento estratégico das ações foram os ingredientes da receita utilizada por Jamil Zampaulo para conquistar um mercado fiel para todos os seus produtos e lucratividade em todas as atividades que desempenha, do gado de corte aos ovos tipo caipira, a mandioca e a amora preta já entregues minimamente processadas a uma clientela ávida por produtos de qualidade. Quanto ao gado de corte, mestiçagens entre Nelore e Senepol, ele conseguiu, nos últimos quatro anos, ser reconhecido como o produtor da região com maior capacidade de lotação animal por área de pasto.
O Sítio São João, que reúne em 16ha três pequenas propriedades, foi herança da família materna, de sobrenome Marsom, antigos produtores rurais da região, terras adquiridas ainda nos tempos em que se firmava a imigração italiana vinda para a colheita do café no início do século passado. O gosto pelas atividades rurais, o amor pela terra ficaram na genética de Jamil, que morou na capital paulista por mais de 30 anos e, ao se aposentar como professor de Sociologia e Economia, resolveu investir na propriedade. Para isso, procurou capacitação e encontrou na Casa da Agricultura de Tietê e na Coordenadoria de Desenvolvimento Rural Sustentável – CDRS Regional Piracicaba, da Secretaria de Agricultura e Abastecimento, o apoio fundamental dos extensionistas para planejar e desenvolver as várias atividades a que se propôs.
O início foi com a melhoria da pastagem, auxiliado pelo engenheiro agrônomo Antonio Carlos Nicolosi de Faria, da Casa da Agricultura de Tietê, para dividir a área onde havia quatro pastos e plantio de cana e milho em nove piquetes de 1ha, no qual instalou três variedades de capim: mombaça, estrela africana e mg-5. “Os maiores entraves eram a água e a insolação, resolvemos isso com a subdivisão de dois piquetes em piquetes menores e irrigados (há um poço artesiano); hoje, a alimentação é toda no pasto, somada às necessárias suplementações de inverno feitas com silagem adquirida de parceiros”. Segundo o ex-professor de Economia, é mais vantajoso.
Dessa forma, já era possível dar início a melhoria genética do gado, contando com a experiência da médica veterinária Flávia Vasques, da CDRS Regional Piracicaba. A Inseminação Artificial em Tempo Fixo (IATF) e a monta natural ainda são utilizadas, e o acompanhamento tem sido feito com o aparelho de ultrassom fornecido pelo Governo do Estado, via Secretaria de Agricultura e Abastecimento, para todas as Regionais da CDRS que têm importante atividade pecuária.
O rebanho varia entre 70 a 80 cabeças com cria e engorda, mas Jamil pretende ter todas as fases até a terminação, um de seus projetos futuros. Enquanto isso, trata cada animal como “doméstico”. O gado de maioria Nelore é manso, como costuma ser o gado leiteiro. A novilha Nina, criada em mamadeira, está em sua primeira prenhez e é acompanhada de perto pela extensionista Flávia. Tem ciúme do dono, dando cabeçadas em quem se aproxima.
Além do gado, muito bem aceito pelos frigoríficos, em paralelo e com apoio do professor e pesquisador Gerson Barreto Mourão da Escola Superior de Agronomia “Luiz de Queiroz” (Esalq-USP), teve início o plantel de galinhas poedeiras. “Estudei as raças, cinco a princípio, e observamos as que melhor se adaptavam; ainda tenho outras, mas a melhor sem dúvida é a Isa Brown”, explica o produtor.
O sistema indicado pela Esalq, de semiconfinamento com oferta de uma ração baseada no milho, garante ovos tipo caipira, de sabor característico, que agradam a clientela responsável pelo consumo de cerca de 50 dúzias de ovos por dia, mesmo com um valor diferenciado (revendedor R$ 17,00 a bandeja com 30 ovos e consumidor final R$ 10,50 a dúzia). O plantel conta com 950 galinhas e, apesar da demanda, segundo os cálculos de Jamil, é preferível manter esse mesmo número. “Aumentar para mais de mil significaria investimentos maiores; no momento prefiro investir em um plantel de qualidade e incluir a criação mista confinamento e pasto”, afirma o pecuarista, que também é avicultor.
Mas a ânsia por conhecimento e diversificação de atividades não para por aí. Com a ajuda de apenas “um funcionário e meio”, diz referindo-se ao único funcionário e à mulher dele, que durante meio período, cuida das galinhas em um serviço que exige delicadeza, silêncio e pouca movimentação, atitudes que influenciam na postura dos ovos e, claro, no fato de a produção se manter no mesmo padrão.
Jamil tem ainda uma área de plantio de mandioca, uma atividade que não exige muita mão de obra no cultivo, mas na qual ele ganha por valor agregado oferecendo aos restaurantes, pequenos comércios e clientes diretos. São 50kg de mandioca por semana, descascada e congelada. Também um valor agregado que reverte em maior lucratividade.
E na cerca que divide o sítio do vizinho, por que não cultivar amoras pretas? Pois bem, a demanda por frutas vermelhas não passou despercebida e os mesmos clientes, os quais já adquirem os ovos e a mandioca, passaram também a adquirir as amoras oferecidas congeladas em pacotes de 500g. “Investigando, descobrimos a melhor forma de congelamento. Elas são muito apreciadas, vendemos tudo o que produzimos”.
A verticalização do Sítio São João vem garantindo boa rentabilidade em todas as atividades. Jamil Zampaulo é a favor da agricultura familiar e não pretende, com pouco mais de 70 anos porém vigor invejável a muitos jovens, aumentar a produção: quer garantir produtos de qualidade diferenciada. Ele mesmo comercializa, com muito orgulho, todos os seus produtos entre Salto, Tietê e arredores.
“Nada como sentir a satisfação de uma clientela garantida, lucro certo e muita energia para continuar aprendendo, sempre”, diz Jamil. E conta que tudo foi possível graças ao trabalho da Secretaria, tanto da Casa da Agricultura quanto da Regional Piracicaba. “Esse trabalho de extensão rural oferecido pelo Governo de São Paulo permite que tenhamos orientação e apoio suficientes, não só para mim, mas para outros que tenham a mesma vocação. Hoje meu Sítio se tornou uma referência em diversidade, produtividade e garantia de mercado. Recebo, com prazer, a visita de outros produtores que querem saber qual é o caminho”, conta. E sem dúvida, o caminho é a capacitação, é estar atento ao mercado, às contas e aos resultados”, ensina Jamil Zampaulo que, ao lado da atual atividade de produtor rural, guarda o dom de ser um professor.