Crônica: O mito de Sísifo – o aluno brasileiro não sabe estudar
Por: Sérgio Sant’Anna*
Sei que o final do ano está chegando , talvez, este não deveria ser o assunto a ser tratado, todavia há que se falar, insistir na premissa de que o aluno brasileiro não sabe estudar. Isso é um fato. Portanto, a solução para este problema deve ser apresentada. Aí este um dos cânceres do ensino educacional brasileiro. Estudar é distinto de assistir aula. Isso mesmo, vamos para o mantra: “Estudar é distinto de assistir aula”. Mas, antes de adentrarmos a esta parte técnica e rascunharmos o caminho a ser percorrido para o êxito, leiamos.
Chega alguns alunos até mim e indagam-me: “Vai ter aula hoje, professor?” Entrego a pergunta: “Por que não teria?”. Calam-se. Pensam, de maneira precária, e respondem: “O ano já terminou, professor”. Elabora uma nova pergunta: “E por que continuas a vir?”. Silêncio sepulcral. A resposta é posta em pauta: “Porque meus pais me obrigam a vir”. A escola usada como uma forma de penalização. E não como um centro de busca pelo conhecimento. Os mesmos traçados do passado. Uma história sombria e pecaminosa por parte do ensino no Brasil. Um Brasil desigual, em que os possuídores dos meios para frequentar o ensino privado não conseguem usufruir desse bem, e aqueles que anseiam por uma oportunidade, agonizam diante da precariedade pública e da ausência de recursos.
É aí que inicio a parte aguda e teórica da minha análise cotidiana. O aluno brasileiro não sabe estudar. São vinte e seis anos ministrando aulas. Sete desses anos foram dedicados ao Ensino Público, já há dezoito anos caminho pelo Ensino Privado (Colégios, Escolas, Cursinhos Pré-Vestibulares e Faculdades), passei por três Estados: São Paulo (Estado onde nasci), Rio Grande do Sul (Porto Alegre, 15 anos) e agora há quatro anos em Santa Catarina (Tubarão), chego à conclusão de que nossos discentes não sabem estudar. Muito dessa inércia está associada à modernidade líquida que destruiu os lares brasileiros. A educação que deveria vir de casa, o respeito aos valores, tornaram-se efêmeros em meio à terceirização dos filhos à Escola. Poucos são os lares, cujos valores são disseminados e agregados aos futuros cidadãos. Atitudes como altruísmo, respeito, e amizade miram a escassez. Essa geração dominada pela tecnologia encontrou um abismo tão profundo, que dificilmente se livrará desta maldição. Assim como Sísifo. E essas atitudes são responsáveis por boa parte do consumo da aula, ou seja, o docente passando boa parte de seu tempo chamando a atenção de alunos pouco educados (lembrando que educação deveria vir de casa), sendo que há um conteúdo a ser cumprido, além de uma série de atividades cujos docentes devem organizá-las para assim cumpri-las. Portanto, meus amigos, aqui vai mais um erro do Sistema Educacional Brasileiro: está errada a forma de conduzir o ensino. Estudar é um ato individual, que se faz em casa, todos os dias, e não apenas em véspera de provas. Agora, assistir aulas é um ato coletivo. Que se faz nas escolas, colégios, cursinhos.
O ENEM demonstra que o ensino deve ser contextualizado, voltado aos eventos do cotidiano e as escolas estão preocupadas com o teor burocrático alicerçadas pelas suas Secretarias de Educação que insistem neste teor burocrático há séculos. A Escola brasileira ainda é tradicional. E a cada ano, através desta burocracia, associada ao desgaste da família, estamos sendo alimentados por um número cada vez maior de analfabetos funcionais. Uma avalanche de brasileiros que não conseguem interpretar um texto simples. Logo, vivemos num mundo caótico. Com um futuro duvidoso. Seres que são corrompíveis desde os primeiros meses de vida quando as trocadas, permutas são estimuladas ao invés das orientações, conselhos, ordens etc.
Dessa forma, caminha-se para a construção (ou desconstrução?) de uma geração de pensadores, seres empáticos, distantes do narcisismo. Caso atitudes drásticas como a proibição de celulares em escolas, a proibição para menores em redes sociais ou mesmo as mudanças radicais nos currículos escolares, estaremos vivendo numa sociedade condenada como Sísifo.
*Sérgio Sant’Anna é Professor de Redação no Poliedro, Professor de Literatura no Colégio Adventista e Professor de Língua Portuguesa no Anglo.
**Os artigos publicados com assinatura não manifestam a opinião de O Defensor. A publicação corresponde ao propósito de estimular o debate dos problemas municipais, estaduais, nacionais e mundiais e de refletir as distintas tendências do pensamento contemporâneo.