17 de janeiro de 2025
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Artigo: A Força Realizadora

Os 80 anos de inauguração da Matriz de São Sebastião

Por: Nilton Morselli*

Quem conhece a Igreja Matriz de São Sebastião a admira por sua arquitetura e imponência. Mas pouco se fala sobre o que motivou um grupo a lançar-se na missão de construir um prédio tão grande e com tantos detalhes arquitetônicos e artísticos há exatos 100 anos. Muito do que sabemos sobre ela está no livro do professor Milve Antônio Peria (1932-2020), que mostra como foi o trabalho do começo ao fim.

O que teria levado os idealizadores a considerar o projeto viável? A esse pensamento alguns fatores remetem: 1) para começo de conversa, a cidade tinha cerca de 20 mil habitantes; 2) por essa razão, a arrecadação da Igreja, via dízimo, era pequena; 3) antigamente (a segunda década do século passado), a engenharia civil não contava com os recursos que tem hoje. Para ficar só na matemática, todos os cálculos eram feitos no papel.

Segundo as pesquisas do historiador Peria, a pedra fundamental foi lançada em 16 de julho de 1925, quando o vigário era o padre Antão Jorge, que tomara posse dois anos antes. “Foi ele quem deu os primeiros passos rumo à construção do prédio da Matriz”, pontua o autor do livro. Mas a missão não foi nada fácil. Ao contrário, muitos percalços foram enfrentados ao longo do caminho, que culminaram com uma extensa paralisação na obra.

O padre Clemente Baltus foi quem deu rapidez ao empreendimento, quando aqui chegou por volta de 1940. O bravo holandês encontrou os serviços paralisados, no alicerce. Muitas campanhas foram feitas para que o templo tomasse forma: colunas, paredes, construção das abóbadas, o madeiramento do telhado e a cobertura. Demorou um bocado de tempo, um pouco menos de dez anos.

Mas a construção total levou muito mais do que isso. Imagine, então, a dificuldade para administrar uma obra dessa magnitude, durante mais de duas décadas – porque ela não estava integralmente concluída quando foi inaugurada – justamente no dia de São Sebastião do distante 1945. Segunda-feira, portanto, serão comemorados os 80 anos desse evento.

Imagine a pressão e a desconfiança geradas pelo ritmo da obra, fora as críticas dos que a chamavam de elefante branco e a consideravam um exagero, uma extravagância. Hoje ela é um ponto de referência em matéria de beleza, no interior paulista.

Esse prédio, de grande valor arquitetônico, só chegou a ser construído porque fora lançado em 1925, quatro anos antes da grande depressão mundial de 1929, a crise do café, que impactou a economia de quase todos os países e especialmente do Brasil, que era grande produtor e exportador do produto. Mas, diante de sua finalidade, certamente contou com as forças do plano espiritual.

Caso a nossa querida Matriz, para onde se transferiu a sede da primeira paróquia da cidade, não tivesse sido lançada naquele momento, poderia não existir por outra razão: nas décadas seguintes, obras suntuosas, de valor artístico e histórico, perderam espaço na prancheta dos arquitetos.

Do barroco ao moderno, passando pelo gótico (como é o caso da Matriz de São Sebastião), foi um salto para trás, pelo menos em questão de beleza. Desapareceram as colunas adornadas com capitéis, as imagens esculpidas nas paredes e os afrescos que também as adornam.

Agora tudo é muito funcional, mas sem aquela beleza de antes.

Voltando à Matriz consagrada ao mártir São Sebastião, sem se demorar na já tão falada e bela decoração interior, destaca-se a coragem de se levar a cabo um projeto vultoso, que passou pelas mãos de vários sacerdotes. O padre Antão – apoiado pela comunidade – foi audacioso ao dar o pontapé inicial no templo que se tornaria cartão-postal. Nele estão impressas as marcas da genialidade do jovem imigrante italiano Ricardo De Lucca (1904-1998), escultor e arquiteto prático, que fez um trabalho importante, dos cálculos estruturais à incrustação da Via Sacra nas paredes. As portas entalhadas com símbolos do catolicismo foram obra do marceneiro João Ariolli.

Tentando responder um pouco mais à pergunta do primeiro parágrafo, um último argumento. Se a fé move montanhas, construir uma igreja é tarefa menos complexa. Aqui, a fé pode ser entendida como força realizadora. A conclusão coube ao Cônego Cavallini (1919-1998), que foi outro mestre na arte de fazer e acontecer – uma das poucas pessoas cujo corpo foi velado naquele lugar sagrado.

Pinturas

Em 2005, a reportagem do Nosso Jornal localizou nos EUA os artistas plásticos Eva e Americo Makk, autores das pinturas da igreja, em 1961. Ela, sul-africana, e o marido húngaro fizeram o belo trabalho sobre andaimes a quase 20 metros de altura.

Tive a oportunidade de entrevistar o casal por telefone, diretamente do Havaí. Américo consagrou-se nos EUA: foi convidado a pintar os retratos de Jimmy Carter (falecido no último 29 de dezembro, aos 100 anos) e Ronald Reagan, que estão na galeria de ex-presidentes, na Casa Branca.

No bate-papo, eles falaram com alegria e entusiasmo de Taquaritinga, onde conquistaram a amizade da pintura Emília Fucci. Aqui, com um filho pequeno, moravam dentro de uma Kombi, que ficava estacionada na Praça Dr. Aimone Salerno. Destacaram que o filho, Américo Bartholomeu, também pintor de talento, é natural da capital paulista.

Américo (agora falecido) e Eva foram contratados pelo cônego Cavallini para ilustrar as paredes da igreja. A Galeria Makk tornou-se uma famosa casa de artes norte-americana.

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Tudo isso aí em cima certamente não vem à cabeça das noivas que, todos os sábados, rumam céleres, belas e esperançosas ao altar mais disputado de Taquaritinga. Mas é sempre bom lembrar como as coisas são feitas, que não existe geração espontânea e o quanto foi custoso construir o lugar mais fotografado da cidade.

*Nilton Morselli é jornalista e assessor de imprensa da Câmara Municipal de Taquaritinga.

**Os artigos publicados com assinatura não manifestam a opinião de O Defensor. A publicação corresponde ao propósito de estimular o debate dos problemas municipais, estaduais, nacionais e mundiais e de refletir as distintas tendências do pensamento contemporâneo.