12 de novembro de 2024
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Crônica: Compreender é diferente de interpretar textos

Por: Sérgio Sant’Anna

Sakamoto afirmou: “Falta amor, porém falta interpretação de texto”. É isso. Vivemos em mundo polarizado, principalmente pelos últimos acontecimentos. E esta seara é alimentada pelas eleições municipais que se avizinham. E não se respeita mais a ênfase em propostas e projetos, meios que inspiravam os eleitores a assistirem os debates. Todavia, não é isso que ocorre mais desde às eleições de 2018, quando Jair Bolsonaro conquista às eleições presidenciais através do uso excessivo das redes sociais e o abuso em mentiras e controversas.

Lê-se muito pouco hoje no Brasil. Não se lê de maneira ativa, ou seja, cuja a intenção era fazer com que o leitor extraísse do texto sua essência, e dessa pudesse emitir um parecer, difundir sua crítica. Talvez esse retrocesso em relação à leitura se deva a não-obrigatoriedade da leitura, assim como os seus exercícios e recursos esquecidos, em parte, pelo ensino atual ministrado pelas faculdades e universidades. Ter o diploma não é garantia de que seja um leitor, principalmente da escrita acadêmica. Dos textos mais densos. Assistidos pelos recursos mais analíticos e precisos. A leitura como forma de liberdade é essencial, desde que já seja um leitor analítico. Ler para passar o tempo é uma forma romantizada imposta pelos livros ficcionais trazidos com afinco pelo Romantismo e Realismo, correntes históricas que aceleraram e difundiram a leitura pelo mundo. Porém, uma leitura suave. Sem às dificuldades e análises de outrora. Embora coberta de conhecimento, esse tipo de leitura não faz do leitor um ser crítico. Capaz de separar o joio do trigo. Formou-se uma geração de leitores, contudo uma geração de leitores que forma leitores de maneira errada. Sem as dificuldades do passado. Sem as exigências programadas para encorpar o afinado leitor. Espere e repare, não sou avesso à leitura como liberdade, bradada por Freire e Rubem Alves, mas não concordo em só trabalhar desta forma na forma de novos leitores. Criou-se uma legião de educadores e educandos incapazes de interpretarem um texto simples. De se concentrarem diante de textões. No watssap usa-se a função para acelerar a fala por falta de paciência. Chegamos ao quase fundo do poço. Analfabetos funcionais. Capazes de cobrarem de seus alunos a interpretação de textos tipo ENEM, entretanto incapazes de permanecerem por mais de três horas diante de questões no mesmo nível para um concurso docente. Hipocrisia?

Compreender e interpretar são funções distintas. Compreender requer uma análise minuciosa da parte externa do texto. Já interpretar é ir além, é mergulhar e pescar os elementos internos de um texto. Ser capaz de inferir. Comandos como: “De acordo com…”; “Segundo…”; “Conforme…” são representantes da compreensão textual, ou seja, ser capaz de encontrar o explícito e nada mais além disso. A interpretação textual requer um repertório sociocultural, capaz de realizar inserções, inferências, intertextualizar… Recursos polissêmicos são vitais por aqui. Por isso, uma leitura direcionada será capaz de capacitar muito mais o cultivo novos e essenciais leitores. Estamos diante de uma frota que a qualquer momento naufragará, principalmente se continuarem navegando sem rumo pelos infomares da internet e redes sociais. Formamos maus leitores. Incapazes de compreenderem e interpretarem.

Ditado, fichamento, resumos, criação de comentários críticos desapareceram das salas de aula em troca de uma flexibilização adotada em prol da geração de zumbis. Seres incapazes de apresentarem sinônimos, antônimos ou mesmo substantivar pronomes indefinidos e trocar o tal “coisa” (festival da coisificação) por um substantivo. Vem cá, leitor, aqui baixinho entre nós: como posso cobrar a interpretação ou compreensão textual se o mesmo não é capaz de realizá-los? E aquele que ensina a compor um texto se ele mesmo não o faz, não consegue…

Urge, portanto, a real necessidade da capacitação docente diante desses dois conceitos: compreender e interpretar. Precisamos amar, todavia necessitamos de uma sociedade capaz de compreender e interpretar aos seus ou ao que eles necessitam dizer ou escrever. Precisamos de leitores ativos.

*Sérgio Sant’Anna é Professor de Redação no Poliedro, Professor de Literatura no Colégio Adventista e Professor de Língua Portuguesa no Anglo.

**Os artigos publicados com assinatura não manifestam a opinião de O Defensor. A publicação corresponde ao propósito de estimular o debate dos problemas municipais, estaduais, nacionais e mundiais e de refletir as distintas tendências do pensamento contemporâneo.