Artigo: Do povo, levanta o clamor
Por: Rodrigo Segantini*
O vereador Valmir Carrilho derrubou a representação do Ministério Público encaminhando pedido pela abertura de processo de apuração de infração político-administrativa em face do prefeito Vanderlei Mársico alegando uma circunstância comezinha: no entendimento do nobre edil, a quem, na condição de presidente da comissão de justiça e redação, cabia a análise prévia do cabimento de tal propositura, o pleito não poderia ser aceito porque não foi apresentado por um cidadão, mas pela promotora de justiça na condição de representante de um órgão.
De fato, Valmir Carrilho pode até ter razão, pois há cabimento em sua interpretação. No entanto, causou espanto que, havendo diante do vereador tantos cidadãos, quais sejam, seus colegas de vereança, nenhum deles tivesse se levantado para, em um arroubo heroico, se propusesse a subscrever o reclamo ministerial para lhe conferir a legitimidade que o presidente da comissão de justiça e redação entendeu ausente. Como o silêncio dos justos diz mais que os gritos dos inocentes, uma sombra de decepção recaiu sobre a cidade.
Mas surpreendentemente houve um cidadão que aceitou fazer um pedido de apuração de infração político-administrativa: o próprio prefeito Vanderlei Mársico. Com sanha persecutória e revanchismo, pediu à Edilidade que apurasse falta que atribui a seus opositores Miriam Ponzio, Tonhão da Borracharia e Rodrigo de Pietro. Qual não foi a surpresa do povo ao tomar ciência de que, essa acusação, sim, foi aceita por Valmir Carrilho para ser levada a termo e submetida ao plenário do Legislativo? Mais uma vez, trata-se de uma interpretação possível, já que é um mero juízo de admissibilidade. Contudo, é esquisito que uma peça volumosa e robusta apresentada com fartas provas do cometimento de falhas pelo prefeito seja deixada de lado, enquanto o chororô do alcaide que não gosta de ser contrariado é recebido sem nenhuma evidência ou indício do que alega.
Como o delegado G, da célebre obra “Assassinatos da rua Morgue”, do imenso Edgar Allan Poe, o vereador Valmir Carrilho parece que está à espera de um detetive Dupin para desvendar o mistério por trás dos crimes que lhe são apresentados para investigar. Enquanto na peça literária, G não parece capaz de apurar coisa alguma sem o auxílio do genial auxiliar, Dupin, ao solucionar a intriga que sustenta toda a trama, conclui que seu chefe é um astuto demais para ser profundo, embora seja pródigo em negar o que é e explicar o que não é. Da tribuna do Legislativo, a partir de prolixos prolegômenos e relatórios soníferos, ainda que tenha fundamentação jurídica, o fato é que, graças a Valmir Carrilho e seus pareceres, três vereadores foram lançados ao leões do plenário, enquanto o prefeito foi poupado.
Porém, do povo, levantou-se um clamor. Foi-se o tempo em que tudo passaria em brancas nuvens. Como dito, se o problema na representação contra o prefeito era a ausência de um cidadão que a subscrevesse, bastaria que um valente se apresentasse para assumir para si tal titularidade. E eis que um surgiu. O estudante Gabriel Belarmino veio à frente e apresentou o pedido do Ministério Público aos vereadores, desta vez com sua assinatura.
Gabriel Belarmino não é um estranho para Valmir Carrilho. Em 2020, ambos disputaram as eleições na mesma chapa do PDT. Valmir ficou em primeiro entre os votados no partido, Gabriel ficou em terceiro. Valmir é advogado e vereador, Gabriel é estagiário em órgãos públicos, de modo que certamente acabam se encontrando por aí, por dever de ofício. Enquanto Valmir lamentou o vício na representação do Ministério Público e a descartou integralmente, sem nem analisar seu mérito, Gabriel a tirou da lata de lixo onde foi lançada para assiná-la e reapresentá-la. Embora companheiros de partido, embora possíveis colegas de trabalho, cada um teve uma postura bastante diferente diante de um mesmo fato.
Ao saber que Gabriel Belarmino teve essa postura, a cidade foi surpreendida. Com alegre descrença, permitiu-se acreditar que alguma providência poderá ser tomada afim de tentar colocar ordem na casa. Neste meio tempo, chegou o relatório do Tribunal de Contas a respeito da gestão da Prefeitura, que é, praticamente, um manual sobre o que não se deve fazer à frente da Administração municipal. Embora entristecidas com a situação, as pessoas da cidade viram isso como mais um passo na busca por alguma coisa que pode ser feita para frear a desgovernança que tem tomado conta de Taquaritinga.
Do povo, levanta um clamor. Por favor, alguém deve fazer alguma coisa. Os servidores não aguentam mais atrasos em seus vencimentos, não aguentam mais ficarem devendo na praça, não aguentam mais serem cobrados por seus credores. Vamos aguardar os próximos passos, na esperança de dias melhores…
*Rodrigo Segantini é advogado, professor universitário, mestre em psicologia pela Famerp.
**Os artigos publicados com assinatura não manifestam a opinião de O Defensor. A publicação corresponde ao propósito de estimular o debate dos problemas municipais, estaduais, nacionais e mundiais e de refletir as distintas tendências do pensamento contemporâneo.