18 de novembro de 2024
Geral

Artigo: As impressões de Caminha ao se abrigar naquele banheiro

Por: Prof. Sergio A. Sant’Anna*

Entrei naquele banheiro e me desesperei. Estava por fazer nas calças, porém fui salvo quando passava por aquela avenida extensa e movimentada e decidi parar ali, num shopping que inaugurara há dois meses e continha em sua estrutura e decoração as mais modernas e criativas obras da arquitetura.

Na entrada não tive tempo de apreciá-lo, pois o banheiro me aguardava e era um caso vital, de calamidade nacional ocasionado pela feijoada enriquecida que tinha consumido na noite anterior. Ao entrar no banheiro não tive tempo para mais nada. Era eu dialogando com um dos tronos imponentes daquele mictório. Sentei-me, parei de suar e esperei pela conclusão da obra. Não deveria ser interrompido, silenciei ao meu celular, recados familiares e escolares foram impedidos de me ocuparem. Era um momento único, de eterno encanto, da análise do cotidiano…

Olhei para o teto e as luzes me impressionaram pelo seu designer, pelas formas geométricas que as moldavam; os azulejos, donos de um branco dantes nunca visto. Reagia eu como Caminha ao relatar ao rei de Portugal o descobrimento de terras brasileiras. Era os detalhes, a beleza das formas, o cheiro aromático exalado pelo perfume do mais perfeito produto químico já inventado na história deste País. As portas reforçadas, rígidas, uma madeira que me fez buscar um perito no assunto, dentro daquele recinto comercial, para poder me explicar à dureza daquele monumento. Uma parte era de lei (madeira eficiente), outra, ornamental, de charão da China.

O vaso dava pena de vê-lo diariamente ser estragado, abusado pelos mais inexplicáveis borrões e urina deixados pelo completo descuido masculino em lidar com o órgão sexual masculino nestas situações. Somos sim o sexo que não sabe mirar a boca do vaso quando vamos fazer xixi. Levantar a tampa, então… Branco vaso, dotado de cacos milimetricamente arranjados, que em contato com as luzes tornava-se um show, um espetáculo das artes, uma exposição ao estilo dos museus contemporâneos. O chão limpo, brilhoso, intacto. As torneiras da pia sentiam a sua presença e jorrava água, esta que também poderia ser bebida segundo bilhete num painel de led que aparecia afirmando a presença de cada indivíduo naqueles assentos. Quando terminei de realizar o serviço, automaticamente um censor vermelho brilhava naquela válvula da descarga e a água varria a sujeira, era um mar, algo que assustaria Hidra, Netuno e companhia. O papel higiênico, estrategicamente colocado, desenrolava-se em metros e assim poderia executar a limpeza com primor. Aos mais sensíveis eram dispostos lenços umedecidos, aromáticos. Na saída, por outra porta, depois da lavagem das mãos, algo triunfal, fechar com chave de ouro, uma mesa com tipos de café (com ou sem açúcar) e alguns tipos de chá.

Uma ida ao banheiro nunca demorou tanto, superei minha esposa e todas as mulheres, passei horas ali (dentro do banheiro, é lógico!), pois queria ler as notícias dos periódicos, mas desta vez estava acompanhado do meu tablet e pude sim ler de maneira sossegada, coberto pelo silêncio e amparado pela tecnologia.

Quem foi que disse que homem não gosta de ir ao banheiro?

P.S.: Não tive tempo de conhecer as demais dependências daquele shopping.

*Prof. Sergio A. Sant’Anna – Professor de Redação nas Redes Adventista e COC em SC e jornalista.

**Os artigos publicados com assinatura não manifestam a opinião de O Defensor. A publicação corresponde ao propósito de estimular o debate dos problemas municipais, estaduais, nacionais e mundiais e de refletir as distintas tendências do pensamento contemporâneo.