Cine-Crítica O Defensor: “Hermanoteu na Terra de Goda – O Filme”: é tão bom quanto a peça
Por: Ruan Reis*
Para começo de assunto, falar de Hermanoteu na Terra de Godah é delicado, principalmente para esse que vos escreve, pois já assisti pessoalmente o espetáculo e inúmeras vezes no Youtube, mas vamos lá…
Filme homônimo da peça da Cia Os Melhores do Mundo e com direção de Bernardo Palmeiro, Homero Olivetto, “Hermanoteu na Terra de Godah” teve sua estreia diferente, era previsto para ter estreado nos cinemas em 2020 e impedido por conta da pandemia. “Hermanoteu na Terra de Godah” chegou diretamente no streaming do Telecine.
Trazendo de volta todos os atores da Cia, como: Welder Rodrigues; Ricardo Pipo; Adriana Nunes; Adriano Siri; Jovane Nunes; Victor Leal. Todos de volta aos seus personagens da peça, com exceção de algumas personas que não estão presentes: Ruth; Raquel; e, Dona Judith Festas. Porém, isto não tira de modo nenhum o brilho da trama.
Sendo ambientada em dois lugares, um no Vaticano nos tempos atuais e outro no passado onde a história bíblica se passa, ambos as temáticas são bem exploradas, sendo a primeira citada, a qual amarra toda a trama, e, o que deixa mais incrível, a história do Pentescopeio título do filme.
Sem contar que, no Vaticano, temos as luxuosas atuações de Milton Gonçalves, Marcos Caruso, e Jonas Bloch, cenas que constroem o cânone do personagem e, já que ele teve sua missão dada por Deus, são nessas cenas com ótimos atores que descobrimos o porquê Hermanoteu não está na bíblia em que conhecemos. Com humor mais dosado e menos caótico que os outros momentos do filme, aqui só resta elogio aos atores que trazem suas atuações mais sérias e, que mesmo assim, têm seu tom de comédia.
Ainda em termos de história, vários personagens da peça, que também estão no longa, receberam mais atenção do roteiro, destaque para Jesus, que é interpretado por Adriano Siri. Ele até surpreende quem assiste, pois faz vários personagens no filme, assim como outros atores do filme, contudo Siri fica realmente camaleônico em suas intepretações. Fazendo Jesus, que tem muito mais espaço do que no teatro, Adriano merece de fato aplausos em todos os seus personagens aqui.
O elenco dá um show no filme, pois realizam a peça desde 1995 e não seria para menos.
Welder Rodrigues, que faz rir em poucos gestos, ganha mais espaço para seu personagem Issac, o qual, na peça, aparece apenas no Egito e, aqui, o personagem ganha mais a tela. Além de fazer rir em todos os seus momentos. Tendo mais dois personagens inéditos na trama, um deles é o apostolo Tomé e outro, que serve como um Fan-Service da vida do próprio Welder, sem contar que Welder está mais Welder do que nunca.
Adriana Nunes, a única mulher do grupo, reprisa seus personagens que também têm mais destaque, com falas diferentes e bem amarradas à trama, complementando-se com o cânone da personagem, Micalatéia. Sendo que ela pode ter facilmente uma série própria, pois, como é mostrado no filme, revelado o porquê da personagem ser conhecida nos quatro cantos do novo testamento.
Victor Leal com seu anjo agora ganha asas de CGI e, aqui, sendo o inédito Judas, mostra que dá para rir mesmo sem os palavrões que ouvíamos na peça.
Jovane Nunes, que para mim é o mais caricato do grupo, se enquadra muito bem no cinema, seja como o icônico Júlio César ou como prisioneiro e consegue tirar risadas facilmente de quem assiste mesmo fazendo um dos apóstolos mais singelos e ingênuos.
Já o protagonista Ricardo Pipo, aqui, deixa o tão caricato Hermanoteu do teatro e mostra que o personagem pode ser mais do que uma “escada” dos outros personagens. No longa, realmente nos preocupamos com Hermanoteu, em momentos até mesmo nos emocionamos, Pipo mostra que é um ótimo ator por não d eixar o Hermanoteu dos palcos de lado.
E, claro, não podíamos deixar de falar de Deus, sendo que Chico Anysio está entre nós, ou melhor, no filme. Uma escolha ótima da produção, mesmo sentindo falta de falas inéditas para complementar as cenas, aqui vale mesmo a homenagem e mantiveram esse elemento da peça no filme.
A direção de Bernardo Palmeiro, Homero Olivetto é boa desde o começo e vem nos apresentando a Pentescopeia, enche os olhos a fotografia como na festa de Roma e em toda a peregrinação do personagem. Diferente de outras produções que possuem locações lindas, como essa do Deserto de Atacama e com a direção errada tudo fica parecendo ser gravado em estúdio, porém, aqui, o deserto é bem dimensionado mostrando ser mais difícil ainda o percurso do protagonista e todas suas visitas em pontos da história. Em momentos como a reunião no Vaticano, realmente nos sentimos dentro da sala quieta para ouvir a história e intimista.
O filme tem sim alguns erros de continuação e em outros até mesmo parece correr demais para o desfecho, mas, com seu estilo Monty Python (não dá para não lembrar de “A Vida de Brian”, mesmo que seja uma história diferente) isso não prejudica o espectador, a quem assistiu no teatro pode assistir sem nenhum medo ao filme e, quem não assistiu, pode se surpreender demais com o humor do grupo em longa-metragem.
“Hermanoteu na Terra de Godah – O Filme” é diferente em todos os aspectos do nosso cinema, sem ser tão ofensivo quanto os especiais de natal do Porta Dos Fundos, parodia tudo tão natural que não dá tempo de ficarmos ofendido e entrega o que se propõem a fazer com leveza e bom humor ao ponto de gostarmos igualmente da peça e do filme.
*Ruan Reis é repórter do jornal O Defensor e apaixonado por cinema, mundo nerd e geek.
**Os artigos publicados com assinatura não manifestam a opinião de O Defensor. A publicação corresponde ao propósito de estimular o debate dos problemas nacionais e mundiais e de refletir as distintas tenências do pensamento contemporâneo.