Artigo: Análise e perspectiva de uma economia sustentável
Por: Leonardo Mattoso Sacilotto*
Atualmente, a extração de recursos naturais é intensiva, a produção e o consumo são rápidos e o descarte, excessivo. Pouco do que é extraído e produzido é recuperado ou reaproveitado. A insustentabilidade desse modelo de produção e consumo, trazida à luz pela crise socioambiental, tornou incontornável a discussão sobre novas práticas, ainda mais relevantes no contexto da emergência climática e da necessária transição para uma economia mais “verde”.
Ao nos tornarmos consumidores conscientes, mais próximos estaremos de uma transição de paradigma. Nesse esforço, o Instituto Akatu, entidade promotora do consumo consciente, listou seis perguntas que um ato de consumo deve incorporar: 1. Por que comprar?; 2. O que comprar?; 3. Como comprar?; 4. De quem comprar?; 5. Como usar?; 6. Como descartar? As perguntas forçam o olhar para a necessidade do consumo, as práticas dos fornecedores, a forma de uso para prolongamento da vida útil e, por fim, a possibilidade de reformar, reutilizar ou reciclar. A destinação final, como resíduo, somente deve ocorrer se nada mais for possível.
Assim, o ato de consumo consciente deve considerar o ciclo de vida de um produto do “berço ao túmulo”, isto é, da extração dos recursos naturais à destinação final dos resíduos. Nesse caminho, deve-se ponderar as externalidades positivas e/ou negativas envolvidas. A reflexão reforça a importância da tomada de consciência do papel do consumo no agravamento da crise socioambiental, cuja contraparte é a potencial capacidade de colaborar para a sua mitigação. O consumo consciente, desse modo, também joga luz à perspectiva social e ética do ato de consumir.
No Brasil, é interessante notar a consolidação de uma mudança de mentalidade. Um recente levantamento da Federação Brasileira de Bancos (Febraban) e do Instituto de Pesquisas Sociais, Políticas e Econômicas (IPESPE) aponta que 77% dos brasileiros consideram que a adoção de boas práticas de sustentabilidade deve ser prioridade, ainda que coloque em risco o crescimento econômico. Nesse contexto, 98% consideram importante ou muito importante que cidadãos e famílias adotem essas boas práticas, inclusive de governança (o que inclui questões como ética, transparência e combate à corrupção); em relação aos governos e às empresas, a porcentagem é de 96%. De fato, o brasileiro está mais familiarizado com as questões socioambientais e passará a exigir cada vez mais ações das esferas pública e privada.
O consumo, a pressão sobre os recursos naturais e a geração de resíduos, porém, constituem uma problemática complexa, cuja resolução não se dará pela mão única dos consumidores. Além da sociedade civil, são necessárias ações conjuntas e integradas que envolvam as esferas governamentais, por meio de políticas públicas participativas e de qualidade, e a atuação do setor privado.
Na iniciativa privada, o atendimento à regulação ambiental se revela cada vez mais insuficiente diante de uma demanda cada vez mais consciente. A pauta ESG (que se refere às boas práticas ambientais, sociais e de governança) é um bom exemplo da conscientização que parte do mercado. Os compromissos firmados por diversas empresas, segundo os princípios ESG, não decorrem da legislação, mas da compreensão da importância do tema.
É certo que, desse contexto, emergem múltiplas oportunidades para o crescimento e a inovação. Os principais desafios socioambientais das próximas décadas somente poderão ser superados mediante investimentos na mudança tecnológica e na mudança de práticas. A participação do setor privado é fundamental – e pode, por outro lado, garantir relevantes vantagens competitivas. Com efeito, pode constituir uma relação “ganha-ganha” que há muito vem sendo buscada quando da incorporação de dimensões socioambientais à produção. A partir do momento que aspectos da agenda ESG passa a fazer parte da cultura da empresa, por exemplo, toda a experiência do consumidor pode ser repensada para alinhar as expectativas desse exigente consumidor ao produto ou serviço que é oferecido. As oportunidades são muitas.
Ao final, todos somos consumidores e, no sentido da máxima ambientalista “pensar global, agir local”, temos nossas obrigações a cumprir. A tomada de consciência a respeito do “ato de consumo” é um passo essencial. Ainda há muito o que fazer, mas, felizmente, essa nova mentalidade parece que veio para ficar.
*Leonardo Mattoso Sacilotto é advogado formado pela FCHS/UNESP; mestre em Direito pela FDRP/USP e doutorando em Política Científica e Tecnológica no DPCT/UNICAMP com pesquisa em ciclo de vida na cadeia produtiva, no contexto da economia circular. Em 2018 recebeu o prêmio José Bonifácio de Andrada e Silva, promovido pelo Instituto O Direito por um Planeta Verde (ICPV), que premia os melhores ensaios acadêmicos inéditos na área do Direito. Integra o escritório Renata Franco Direito Ambiental e Regulatório. Além da experiência na área ambiental, cível e digital, possui certificação pela ESA/OAB em Direito Ambiental e pela Fundação Getúlio Vargas (FGV) em contratos, compliance e em Direito da Regulação.