Artigo: Parcelamento do pagamento de precatórios é calote disfarçado de campanha política
Por: Antonio Tuccilio*
E a novela do pagamento dos precatórios só continua – e não caminha para um final feliz. Recentemente, o ministro da economia, Paulo Guedes, fez uma curiosa declaração em webinar sobre o assunto: “Devo, não nego, pagarei assim que puder”. Que bom que o Excelentíssimo Ministro admite que o governo deve ao povo, mas como assim “pagarei quando puder”? Sr. Ministro, para sua informação: dezenas de milhares de pessoas morrem esperando o pagamento dos precatórios. Mesmo assim, o sr. propõe prolongar mais ainda o prazo para recebimento?
Antes de ir em frente é muito importante pensar em todas as pessoas aptas a receber precatórios. São aquelas pessoas desapropriadas para construção de obras públicas, contribuintes que pagaram mais impostos do que deviam, servidores públicos que pleiteiam direito a reajuste salarial, entre tantos outros. As dívidas acumuladas do Estado somam milhões, mas a proposta do Ministro é parcelar os pagamentos em até 10 anos. Isso mesmo, uma década.
Também é importante entender o que estão por trás dessa proposta de adiamento. Bom, de acordo com Paulo Guedes, os precatórios são como “meteoros vindos de outros poderes”. Dito isso, o ministro apresentou uma PEC (Proposta de Emenda Constitucional) que, se aprovada pelo Congresso, autorizará o governo a pagar R$ 40 bilhões a mais do que o previsto para 2022. Sim, no próximo ano, curiosamente o ano da próxima eleição presidencial. Guedes acha que essa PEC é capaz de destruir “maus presságios que turvam o futuro do governo” e pode alavancar a popularidade do presidente.
O Artigo 100 da nossa saudosa Constituição Federal é bem claro quanto a inclusão do orçamento do valor dos precatórios:
“Art. 100 Os pagamentos devidos pelas Fazendas Públicas Federal, Estaduais, Distrital e Municipais, em virtude de sentença judiciária, far-se-ão exclusivamente na ordem cronológica de apresentação dos precatórios e à conta dos créditos respectivos, proibida a designação de casos ou de pessoas nas dotações orçamentárias e nos créditos adicionais abertos para este fim.”
“(…) § 5º É obrigatória a inclusão, no orçamento das entidades de direito público, de verba necessária ao pagamento de seus débitos, oriundos de sentenças transitadas em julgado, constantes de precatórios judiciários apresentados até 1º de julho, fazendo-se o pagamento até o final do exercício seguinte, quando terão seus valores atualizados monetariamente.”
Com todo respeito, mas me parece que o sr. Ministro não conhece a Constituição Federal como deveria. O ato de não cumprir decisões judiciais e não incluir o valor dos precatórios federais no orçamento apenas reforça a ignorância constitucional.
Sejamos francos: isso parece muito campanha antecipada para reeleição do presidente. E, como sempre, a política demonstra sua insensibilidade com os direitos e interesses do povo brasileiro. Essa medida representa um calote.
Como sempre nossos representantes no poder não mede esforços para prejudicar aqueles que precisam receber o dinheiro a que têm direito. Se aplicassem todo esse esforço para resolver a situação, a dívida estaria praticamente quitada.
Como cidadão e representante dos interesses dos servidores públicos apelo ao Congresso Federal para que não aprove essa medida descabida. Isso não é um avanço; é jogo político escancarado.
*Antonio Tuccilio, presidente da Confederação Nacional dos Servidores Públicos (CNSP).
**Os artigos publicados com assinatura não manifestam a opinião de O Defensor. A publicação corresponde ao propósito de estimular o debate dos problemas nacionais e mundiais e de refletir as distintas tenências do pensamento contemporâneo.