26 de dezembro de 2024
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E essa contingência aí: Filho não é patrimônio

Olá caros leitores, o título de hoje é um pouco forte e pode chocar na primeira leitura, mas espero que ao decorrer do texto eu consiga trazer a ideia principal desse título juntamente com o entendimento que de que sim, filho não é patrimônio. É comum ouvir de alguns pais os planos para que seus filhos cuidem deles quando ficarem velhos, mas será que esse são os planos dos seus filhos? Afinal, você está criando um cidadão ou uma previdência privada?

Eu entendo e compreendo que tanto na gestação, primeira infância e até no processo de adoção há muitas expectativas em cima da criança que fará parte da família, é comum planejar o quarto, o enxoval, pensar nas possíveis carreiras, curso de inglês, ballet, escolinha de futebol, natação, ficar em dúvida entre MBA ou mestrado e ai em um belo dia seu filho adolecente chega para você e diz que vai ser influencer digital, streamer de jogos ou tiktoker, qual será sua relação?

É lógico que não foi isso que você preparou para o futuro do seu filho e a criação de filhos não é uma receitinha de bolo que é só separar os ingredientes, colocar na medida certa, misturar e colocar para assar. A decepção e a frustração só ocorrem quando é depositada muita expectativa diante daquela criança e sei que os pais querem o melhor para seus filhos, mas o melhor do seu ponto de vista, é o melhor do ponto de vista do seu filho?

E se preparem, pois esse parágrafo pode doer muito no coração de muitos pais. O seu filho não lhe deve respeito, não lhe deve amor, não lhe deve admiração, pois a criação não é uma financeira e sentimentos não são emprestados, não tem como emprestar amor, para depois você exigir de volta com juros e correção monetária. Durante a criação você dá os seus sentimentos mais nobres sem pensar ou querer-los de volta.

“Ah, mas Lucas, você está dizendo que eu vou dar todo o meu amor, minhas horas de sono em claro, preocupações com doenças e riscos, comida, moradia, fazer diversos sacrifícios para não ter nem o amor como retribuição?” Sim, você entendeu perfeitamente, é exatamente isso. Porém calma, eu não estou falando que sentimentos como amor, respeito e admiração não vão surgir em seu filho e esse é o ponto fundamental da discussão. O que eu estou dizendo é que seu filho não lhe deve esse tipo de sentimento, não que ele não terá.

É natural que durante a criação seu filho desenvolva carinho, amor, respeito, admiração, dentre outros sentimentos positivos na relação pais e filhos. Entenda a respeitar o ser humano que é o seu filho, que ele, assim como você, tem sentimentos, anseios, planos e sonhos. Seu filho é um indivíduo diferente de você e você tem que entender isso. Feito isso, as coisas começam a fluir de forma positiva.

Agora podemos começar a falar sobre formas de criação que podem causar efeitos negativos ou positivos em seus filhos. Como eu disse, criação não é receita de bolo, mas há atitudes que os pais podem tomar que pode contribuir para um crescimento psicologicamente sadio das crianças.

Uma pesquisa realizada (Darling, 1999) mostra que filhos de pais autoritários possuem um desempenho escola moderado e poucos problemas comportamentais, porém altos índices de transtornos de ansiedade, depressão, pouca habilidade social, baixa auto-estima, além de formas de externalização exacerbada (gritos, destruição de objetos em momentos de fúria, etc.).

Então isso quer dizer que devemos ser permissivos? De forma alguma! Pois em pesquisa realizada com pais permissivos encontram-se filhos com alto índice de uso de drogas lícitas, baixa auto-estima, baixa capacidade de auto-regulação, sintomas depressivos, problemas afetivos, problemas comportamentais e maior índice de estresse (Weber et. al. 2002; Quintin, 2001; Cohen e Rice, 1997; Darling 1999).

O autor Baumrind (1966) propôs um estilo chamado de autoritativo, que não envolve nem ser autoritário e nem ser permissivo, porém estar presente de forma ativa na criação e educação dos filhos. Sentimentos são sempre uma vida de mão dupla, portanto Baumrind propõe aos pais não apenas instruir os filhos de forma verbal, mas mostrar no dia-a-dia os conceitos que eles querem que os filhos aprendam. Como exigir respeito de uma criança se ela não conhece esse conceito e não vive ele na rotina de casa? Como exigir amor se a criança não sabe o que é ser amada?

A criança, ainda descobrindo o ambiente pega um objeto e deixa cair, vê graça no ato, o adulto pega do chão e devolve para a criança, que repete a ação de deixar o objeto cair e o adulto repete o ato de pegar o objeto do chão e devolver para a criança. Então a criança mais uma vez joga o objeto no chão e é repreendida quase de forma instantânea pelo adulto, que grita e esbraveja, dizendo que não é empregado da criança para ficar catando o objeto toda hora e a criança sem entender nada entende que ela não pode explorar o ambiente. Nesse exemplo a criança estava apenas descobrindo a gravidade.

Outro exemplo é a típica parede toda rabiscada de canetinha, qual seria sua reação diante desse caso? Muitas crianças são duramente repreendidas, colocadas de castigo e tudo o que ela queria era presentear os pais com uma obra de arte. Em vez de repreender (autoritário) ou até mesmo de deixar que a criança rabisque a casa toda (permissivo), converse com a criança, explica que o desenho apesar de ser lindo, seria muito difícil arrancar toda a parede para colocar em exposição do museu do louvre, além de não ser interessante deixar toda a casa rabiscada, ofereça cartolinas e mais canetinhas e diga que naquela papel é o lugar certo de desenhar e que se presenteado por um desenho feito naquela cartolina se sentirá a pessoa mais feliz do mundo (autoritativo).

Espero que tenha ficado claro a ideia principal do exposto e diante de tantas reflexões, deixo aqui um questionamento para você, se pais ou mãe, se fazer. Qual estilo de criação você se enquadra mais?

*Lucas Fernando de Oliveira Fanelli é psicólogo formado pelo Instituto Taquaritinguense de Ensino Superior – ITES

**Os artigos assinados não representam a opinião de O Defensor!

Referências Bibliográficas

  • Darling, N. (1999). Parenting style and its correlates. Parenting style and its correlates. ERIC/EECE Publications Digests. Retirado em 12/02/2002, do ERIC/ EECE no World Wide Web http://ericeece.org/pubs/digests.htm
  • Quintin, P. E. (2001). Chamgements familiaux à long terme à la suite dune intervention écosystémique. Em J. Torrente (Org), La maltraitance Regars pluridisciplinaires (pp. 191-214). Revigny-sur-Ornain: Hommes et Perspectives.
  • Weber, L. N. D., Biscaia, P., Paivei, C. A. & Galvão, A. (2002). A relação entre o estilo parental e o stress infantil. [Resumo]. Em Conselho Regional de Psicologia do Paraná (Org.), Psicologia em Conexão 40 anos de Profissão, X Encontro Paranaense de Psicologia, Curitiba PR: CRP 08.
  • Cohen, D. A. & Rice, J. (1997). Parenting styles, adolescent substance use, and academic achievement. Journal of Drug Education, 27, 199-211.
  • Baumrind, D. (1966). Effects of authoritative control on child behavior. Child Development, 37, 887-907.