22 de dezembro de 2024
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Artigo: Inspiração, crônica e as atrocidades destes tempos

Por: Sérgio A. Sant’Anna*

Ao longo dos anos fui alimentado pelo discurso de que para produzir um texto bastava estar inspirado. Atrelado a esse discurso senso comum, somava-se a definição de que a inspiração nascia da positividade (talvez os livros de autoajuda possam sanar esta dor), porém é com o tempo e o exercício da leitura que percebemos que a inspiração não é algo messiânico, salvífico. Não pertence a este ou aquele; e muito menos será sempre cercada de elementos positivos. A deusa Inspiração é um devaneio medieval. Chegada até nós pela incapacidade do homem medieval em produzir seus textos, acostumado ás cópias.

Somos inspirados pelo nosso dia-a-dia. O gênero crônica apresenta uma definição clara sobre a inspiração adquirida no cotidiano, somada aos elementos que nos envolvem nesse mundo cada vez mais dinâmico. Conversar com um amigo, destinar-se a um café ou um bar e observar aos que ali estão ou na janela de um ônibus apreciar a paisagem mesmo que já tenha passado por aquele local diversas vezes, o olhar tem a necessidade de sempre ver mais, detalhar. Mas, também será importante aprender a conviver com as adversidades, tanto aquela que restringe o escritor ao vazio ou quando os sentimentos e situações negativas se aglomeram em seu cotidiano. É o momento propício para o texto ser confeccionado. Aproveitar as ideias definidas como negativas é parte do trabalho do escritor. Transformá-las em pérolas é a função daquele quem lida com o texto. E as boas ideias não estão apenas no mar calmo de águas cristalinas, águas turvas esperam por você. Principalmente pelo momento atual que vivemos. Somos tragados pelo negacionismo, pelo zombaria diante das vítimas da covid-19, governados por um ogro e nada fazemos. Apenas textos. Palavras difundidas…

A deusa Inspiração foi levada a este patamar devido aos gregos e consequentemente aos filósofos que atribuíam a eles essa dádiva. A exaltação a um mito, àquele que era o dono da sabedoria e a esta compactuava sendo este um dom, um elemento divinal. Porém, a escrita necessita muito mais de transpiração do que essa “mal empregada” inspiração. Escrita provém de esforço, de leitura, um exercício constante e rotineiro. Uma atribuição e responsabilidade àqueles que tentam, lançam-se a este caminho espinhoso, todavia fraternal. Cercado pela imaginação, mas dotado de ideologia e propósitos. Aí está o “barato” da escrita, um movimento cercado pelo esforço, pelo suor, pelo empenho. A escrita necessita renascer, especificamente diante do escuro em que nos encontramos, típico da medievalidade.

Faz-se necessário buscarmos elementos fora deste mundo imagético criado pela dulcíssima da inspiração. Cercarmo-nos de leituras, histórias, causos, que se associem ao nosso poder de regurgitação e transformar ideias em textos, sem os elementos míticos, sem o poder mitológico da deusa Inspiração. Você foi ludibriado. A população encontra-se atônita. Quem cala, consente!

*Prof. Sergio A. Sant’Anna – Professor de Redação nas Redes Adventista e COC em SC e jornalista.

**Os artigos assinados não representam a opinião de O Defensor!