22 de dezembro de 2024
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Artigo: O silêncio do conivente

Por: Ricardo Viveiros*

O Senado brasileiro instaurou uma Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) para investigar o que o Governo Bolsonaro possa ter feito de errado na consciência, planejamento, estratégia e ação contra a pandemia da Covid-19.

CPIs têm poder, geram impeachment de presidentes. Fernando Collor caiu ao final de uma CPI. De 1988 para cá, esse tipo de investigação conquistou ainda mais força, passando a quebrar sigilos bancário, fiscal e telefônico como, até então, só o Judiciário tinha condição de fazer.

O que determinará essa nova CPI? O parlamento, a quem cabe por vontade popular a fiscalização do Executivo, irá ou não cumprir, rigorosamente, com a liberdade de apurar e determinar a culpa da tragédia? Em plena pandemia, além do negacionismo e outros erros, em dois anos foram nomeados quatro ministros da Saúde.

O grande personagem dessa CPI é, sem dúvida, o general de divisão do Exército Brasileiro, Eduardo Pazuello. Qualquer resultado começará, passará e terminará nele. Pazuello não tem formação na área da Saúde, nem mesmo em Logística que teria sido o bom motivo pelo qual Bolsonaro o nomeou para ministro. A rigor, traz no seu currículo denúncias de corrupção envolvendo curso de paraquedistas e desvio de munição nos tempos em que estava nos quartéis. Sua passagem pelo Ministério contabiliza desde a recomendação de uso da cloroquina, cientificamente não comprovada; passando por descaso e militarização da pasta; incentivo à desinformação sobre a pandemia, atrasos na compra de vacinas e responsabilidade pelo colapso nos hospitais de Manaus, no Amazonas, gerando muitas mortes.

Fontes informam que Pazuello vem sendo “treinado” para sair-se bem na CPI, e proteger Bolsonaro. Perda de tempo, ele não assimila esse tipo de preparo, é autoritário demais para tanto. Outras fontes, asseguram que ele já teria aceito o sacrifício da condenação para proteger o presidente. Por fim, ainda corre por fora a hipótese dele ser fidedigno aos fatos e mostrar quem, de fato, tem a principal responsabilidade pelas consequências da má gestão. Aquele ao lado do qual deixou claro, em uma entrevista, que militar apenas cumpre ordens.

Bolsonaro tentou dar um novo cargo a Pazuello no Governo, no qual tivesse foro privilegiado e, assim, ficasse “blindado”. Não conseguiu, teria que desalojar outro militar ou, pior, sacrificar indicados de aliados políticos, em especial do Centrão. Um dia após ser exonerado do Ministério Saúde, porém, a Procuradoria-Geral da República pediu o envio do inquérito contra Pazuello para a primeira instância.

Recente portaria retornou Pazuello ao Exército. O documento não detalha qual posto o general ocupará, mas é bem provável que seja um cargo restrito a militares no Ministério da Defesa. Enquanto isso, a CPI ouvirá muitos depoimentos. Vai lidar com “nitroglicerina pura”. Pazuello – seja qual for o resultado final da investigação parlamentar – é o personagem mais cotado para ter a culpa de uma tragédia muito maior do que ele teria, sozinho, a capacidade de gerar.

*Ricardo Viveiros é jornalista, professor e escritor. Doutor em Educação, Arte e História da Cultura pela Universidade Presbiteriana Mackenzie, membro honorário da Academia Paulista de Educação (APE) é autor, entre outros, dos livros “Justiça Seja Feita” e “A Vila que Descobriu o Brasil”.