Artigo: Saudades
Por: Prof. Sergio A. Sant’Anna
Esse meu texto começou a nascer depois de um diálogo com o meu vizinho, Seu Moacyr, coveiro concursado, que há décadas labuta oito horas por dia, e nesta pandemia – muito mais. Falávamos sobre a pandemia e os entes queridos enterrados por ele – um momento de desespero e saudades – resumiram o seu falar. Palavras que misturadas aos vocábulos: dor, mortes, deixam-nos cada vez mais desesperançosos diante de um cenário catastrófico. Talvez, seja eu nietzschiano demais. Porém, no escuro estabelecido por esse aglomerado de ignorância que nos governa, não consigo avistar luz. Tempos obscuros e sombrios.
Lembrei-me ali, diante da conversa, sobre a última obra publicada pelo escritor gaúcho Érico Veríssimo – Incidente em Antares. Relatava ao meu vizinho a greve dos coveiros e a revolta dos mortos em esperar para serem enterrados. Seu Moacyr, gosta de ler, porém desconhecia esta clássica obra. Disse-me: “Os coveiros brasileiros estão chegando ao limite…imagine se isso viesse a acontecer aqui no Brasil…”. Refletimos um pouco e voltamos a dialogar. Sua obra preferida é, Iracema, pois desde muito novo fora orientado pelos pais, também com pouco estudo, que o seu nome viera deste romance alencariano. Na escola chamavam-no, o filho da dor. Significado do nome Moacyr – fruto da união entre o branco Martim e a índia, virgem dos lábios de mel, Iracema. Hoje quando me lembrei desta minha cena cotidiana, o meu coração, chorou a saudade dos meus amigos e entes queridos que se foram vítimas desta doença. Neste dia nacional da nossa Língua Portuguesa (05 de maio), a palavra que sobressai diante das demais é “saudades”. Saudades das vítimas da covid-19; saudades das vítimas da cidade de Saudades aqui em Santa Catarina, crianças com menos de dois anos de idade e duas professoras, vítimas de um sanguinário, que a golpes de facão executou anjos; saudades do ator Paulo Gustavo e o humor que nos fazia sorrir em meio a esse Brasil do ódio bolsonaristas; saudades da distância que nos separa em meio à pandemia, dos abraços acalorados, dos beijos esquecidos, do carinho alimentado. São mais de 400 mil famílias brasileiras que sentem saudades dos seus parentes queridos.
Triste realidade brasileira. Que se acovarda diante de palavras belicosas balbuciadas por um capitão expulso do Exército. Um ex-deputado federal, que durante 28 anos apenas usufruiu das benesses do cargo ocupado, além da difusão do ódio, do preconceito, da misoginia. Um homem preocupado apenas com os interesses familiares, distante das políticas publicados, avesso à Ciência, propagador de notícias falsas.
Sinto saudades de uma época em que a população brasileira era melhor assistida, a Ciência difundida, e ódio apenas uma menção a esses crápulas, que estavam escondidos, à espera de alguém que pudesse falar e agir por eles. Os covardes sentem saudades?
*Prof. Sergio A. Sant’Anna – Professor de Redação nas Redes Adventista e COC em SC e jornalista.
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