22 de novembro de 2024
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Artigo: Não dá para entender

Por:Rodrigo Segantini*

Compreensível que os empreendedores queiram que os estabelecimentos possam voltar a funcionar como antes da pandemia. As contas chegam, há compromissos a serem cumpridos, a vida não parou. É necessário haver faturamento para que os negócios sejam mantidos e, para isso, é preciso que possam funcionar. É entristecedor ver o desespero de empresários consumindo as economias de uma vida para tentar manter suas empresas. Chegamos a um ponto em que eles aceitam qualquer limitação, qualquer regra e fazem qualquer promessa só para abrirem as portas.

O que não dá para entender é as pessoas correrem para frequentar o comércio. Em um cenário em que faltam vacinas, faltam insumos para internação, faltam leitos hospitalares, não tem cabimento a pessoa se dispor a sair da segurança de sua casa, a não ser em situação de absoluta necessidade. Há quem diga que não aguenta mais ficar em casa e precisa ir para a rua. Há algo estranho em alguém que não suporta ficar no lugar que escolheu para morar ao lado de pessoas que diz amar e tem necessidade de se expor e correr o risco de se infectar com o causador da maior tragédia sanitária dos últimos 100 anos.

Também não há explicação para um governante que, apesar de seu ministro da saúde recomendar máscara, higienização das mãos e distanciamento, insiste em fazer exatamente o contrário e repetir um corolário mentiroso acerca de medicamentos contraindicados para covid. Da mesma forma, inexplicável como que o presidente de um país deixa seu ministro da ciência anunciar que foi encontrada uma vacina genuinamente nacional contra a doença para, semanas depois, cortar as verbas para as pesquisas necessárias ao seu desenvolvimento e produção.

Enquanto brasileiros morrem aos borbotões apesar do sacrifício das equipes de saúde para salvá-los ou para lhes dar alguma dignidade em seus últimos momentos,  enquanto cientistas e pesquisadores veem seus trabalhos serem desprezados e desconsiderados sobre os cuidados necessários para conter o avanço do vírus sobre a população,  enquanto o povo sai às ruas como se não houvesse amanhã (e para muitos poderá não haver mesmo, diante de tanta imprudência), enquanto não há uma liderança nacional disposta a assumir seu papel na condução da nação neste momento tão difícil, quem sofre é o empreendedor.

Quem deixa de vender, quem deixa de produzir, quem deixa de ganhar, quem deixa de pagar é o empresário. É para ele que chega a conta da nossa irresponsabilidade. O preço que ele paga é o encerramento de sua empresa, a demissão de seus empregados, o calote em seus fornecedores e nos impostos. A moeda com que ele paga é sua saúde, sua reputação, sua honradez.

Há situações que dá para entender, há outras que não. De tudo isso, o mais desesperador é perceber que parece que ninguém aprendeu nada depois de tudo e estamos repetindo os mesmos erros, insistentemente. Estamos desafiando o que não podemos compreender mesmo que isso custe nossas vidas, mesmo que isso já tenha custado as vidas de tantos de nós.

A culpa não é do comércio, mas de quem não se importa de, ao penhorar sua alma, arrastar os outros consigo. Se for preciso ir às compras para adquirir o presente do dia das mães, para buscar mantimentos ou mesmo para trabalhar, use máscara, higienize as mãos com frequência e mantenha distanciamento social. Se não precisa ir ao comércio nem mesmo para trabalhar, fique em casa.

*Rodrigo Segantini é advogado, professor universitário, mestre em psicologia pela Famerp.

**Os artigos assinados não representam a opinião de O Defensor!