Papel higiênico, cloroquina e a volta às aulas
Por: Prof. Sergio A. Sant’Anna
Percebi que muitas eram as horas sentado em frente ao computador caseiro (aquele mesmo, o que me acompanha desde 2007), ao meu lado o celular pipocando mensagens pelo WhatsApp. Comecei lendo aos meus e-mails, depois postei mais um artigo nas redes sociais e lá fui para mais uma “live” e depois algumas aulas zoom com meus alunos de Literatura e Redação; enviei três ou quatro crônicas aos jornais. Confesso que todos os dias necessito postar algo pertinente e relacionado ao meu cotidiano de leitor e professor no Facebook e Instagram. Minha intenção é fazer com que os meus leitores reflitam, concordando ou discordando; acredito na argumentação como elemento primordial em uma democracia, elo vital para a construção de um texto dissertativo-argumentativo.
Não consigo sair da frente da tela do computador, principalmente, depois do início da pandemia. Aulas e mais aulas acontecendo de maneira dinâmica, seja por chat, pelo zoom, por lives etc. Além disso, o preparo e reinvenção que buscamos para esse momento. Tornamo-nos, meus leitores, servos da internet, alienados pelas ferramentas tecnológicas, todavia foi inevitável. A Educação clamou por isso, nossos alunos precisavam do nosso apoio. A Escola não poderia parar. O Ensino Remoto foi a maneira encontrada para que pudéssemos estancar aquela ferida aberta pela ausência das aulas presenciais. Uma revolução diante do ensino? Não. Apenas uma adaptação, um momento de superação, período em que a sociedade começou a clamar pela Escola. Porém, não se alegrem, pois continuam acreditando na Escola apenas como depósito de filhos e terceirização da Educação; e não enxergam a valorização docente, o conhecimento doado, às muitas horas a mais que passamos diante do computador, do celular e a qualquer momento podemos ser interpelados por uma mensagem de celular, a qualquer dia da semana. Não possuem limites. Não estavam preparados para ficarem com os filhos. Acostumaram-se a chamada terceirização. Filhos na Escola, alegria em casa.
Este é um pensamento que necessita ser mudado, a Escola necessita ser valorizada, os professores e funcionários precisam de apoio, clamam por ajuda. A Escola não deve mais ser encarada como um depósito; enquanto trabalhamos, há aqueles que nos criticam, questionam e nos adjetivam como preguiçosos. Um não-retorno às aulas, decisão de inúmeros professores amparados pelo protocolo da Ciência e seus especialistas, alarma muitos e os enchem de raiva para vociferarem asneiras diante de um momento tão delicado. O recado transmitido pelas redes sociais, tornou-se viral e propício a este momento: “As escolas não controlam o surto de piolhos, como controlarão o novo Coronavírus?”. Verdade. Será que estamos preparados? Há escolas que não possuem papel higiênico, como conseguirão suprir a ausência do álcool? Com água e sabão? E aquelas escolas que várias vezes por dia sofrem com a escassez hídrica? Diante da deficiência das escolas públicas, as particulares perdem seus alunos para ausência de capital, que só aumenta o abismo social e traz ao novo normal uma avalanche de desempregados e famílias cada vez mais pobres. A Economia sofre, o Mundo agoniza, a Terra chama-nos à empatia. O Capitalismo sobreviverá, todavia teremos que buscar meios subjetivos para que voltemos os olhos aos iguais, aos demais seres humanos, despidos dessa barreira ancorada num racismo arcaico e vigente, num distanciar social gigantesco renascido dos mais perversos costumes considerados morais.
A lucidez que nos resta, a disposição que nos fortalece devem ser mecanismos vitais nesse momento em que esperamos por esse tal de “novo normal”. Mas, não aguardemos por ele, porque serão necessários mais do que já fizemos e parece que inúmeros cidadãos não estão dispostos. A começar pelo desprezo doado às escolas e aos seus membros. Os gritos insanos para que as escolas retomem suas atividades, alardeados de Norte a Sul, são apenas brados de uma população embriagada pela cloroquina, ivermectina, negacionismo, racismo, contrários à Ciência, que grita pelas redes sociais, agora, porém na prática alinham-se ao confortável discurso da exclusão e do egoísmo. Investir em Educação e Cultura seria vital, porém as evidências demonstram que pandemias muitas, diferentes dessas, teremos que enfrentar, a começar pela ausência de empatia e a criação de zumbis.
*Prof. Sergio A. Sant’Anna – Professor da Rede Adventista em Santa Catarina; Corretor de Textos em “Redação sem Medo”.