17 de novembro de 2024
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Especial somos todos: um tratado semântico

Por: Prof. Sérgio A. Sant’Anna*

A amiga professora Daiane Emerim confessava-me a importância do seu curso de pós-graduação (Neuropsicopedagogia), e o quão importante é a qualificação docente; a reciclagem faz parte desse processo de transformação. É durante esse processo que presenciamos o sentido pragmático da frase de José Saramago: “Para ver a ilha, é necessário sair da ilha”.

Durante esse nosso diálogo, utilizando-se desse vocábulo no seu mais essencial semanticismo, amparado nas minúcias socráticas, confesso ter saído alimentado. Quanto conhecimento fora-me transmitido. Aprendi muito durante alguns minutos de diálogo na sala dos professores. Todavia, o que me leva à escrita deste artigo de opinião são os aspectos semânticos representados através das palavras empregadas para suavizar vocábulos ditos como inaceitáveis, o denominado politicamente correto.

Diante do estudo da parte conotativa da Língua Portuguesa, ou seja, seu aspecto figurado, esses vocábulos suavizados são substantivados como eufemismos: gordo, obeso; cego, deficiente visual; aleijado, deficiente físico. Confesso que o politicamente correto inibe, por diversas vezes, a expansão sinonímica. Acredito na maneira como o emissor transmite essas palavras ao seu receptor, todavia na escrita essa empatia necessita ser muito bem elaborada, pois se pode ser alvo dos analfabetos funcionais (eu que o diga com minhas postagens críticas nas redes sociais), seres habituados à leitura de manchetes e no máximo livros de autoajuda. E nosso dever como estudiosos da Língua Portuguesa é demonstrar que na escrita há que se ter o cuidado ao empregar determinados vocábulos sejam eles relacionados ao campo semântico das gírias, jargões, dialetos, entre outros, pois a variação linguística desperta interpretações diversas, assim como o contexto. Logo, ser claro e objetivo, nestes tempos de escrita em mídias sociais, merece atenção redobrada, pois o receptor (que são vários) pode entender da maneira como lhe convém e assim disseminar o famoso “telefone sem fio”. Não adentrarei aqui ao mérito e importância da leitura e a ausência por parte dos iletrados, que se gabam por ter lido apenas um livro anualmente, tão pouco me submeterei ao exercício desgastante de tentar ensiná-los através do método Paulo Freire, mas deixo aqui a eficácia do tratado freireano. Método que engloba a reflexão, não só da parte Linguística, mas de áreas afins como: Filosofia, Sociologia, História, Geografia Humana, Ética etc., para tanto outro artigo seria necessário.

Que o mundo está chato, que as pessoas tornaram-se intolerantes, que o maniqueísmo tomou conta dos diálogos, que a pós-verdade reverberou, sim, mas o leitor tem o dever de receber um texto estruturado, digno, que lhe proporcione a reflexão, exercite o pensar, não dê margem a falsas e infundadas posições. E as palavras podem provocar esse desabrochar.

Post Scriptum: segundo a Professora Daiane Emerim, o termo “especial” não cabe mais, pois todos o são. A LBI (Lei Brasileira de Inclusão) diz que o correto é PCD (Pessoa com Deficiência); assim como o termo integrar deve ser substituído por incluir, pois aquele designa só alguns; este, todos. Lembro-me de Bauman diferenciando caridade de altruísmo; a primeira denota a busca por uma recompensa pelos seus atos, já o altruísmo o coloca na posição do outro não exigindo nada em troca.

*Prof. Sérgio A. Sant’Anna – Taquaritinguense.  Professor de Redação e Língua Portuguesa na Rede Luterana de Ensino de Porto Alegre e Região Metropolitana; Professor na Rede Universitário de  Cursinhos Pré- Vestibulares do Rio Grande do Sul e Professor de Atualidades e Redação do Certo Vestibulares em Porto Alegre.